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Fado Alvito
 

Sagrada Mentira​

Letra:     Domingos Gonçalves da Costa      
Música:           Jaime Tiago dos Santos
Intérprete:        Fernando Maurício


 

Tenho as estrelas por telha
O meu tecto um velho barco
Por paredes a maresia
Espreita-me o arco-da-velha
Como se a velha e o arco
Me fizessem companhia


O corpo já não reclama
Os colchões de pedra dura
A que está habituado
Mas por dentro há uma chama
Que arde viva e segura
No meu sangue revoltado


Quando chega o vento aflito
Contra os vidros da janela
Do quarto que não conheço
Sopro para o infinito
Apago a última estrela
Logo depois adormeço

Fado Alvito

Fado da 3ª geração, em modo maior, e na opinião de muitos especialistas, um dos mais bonitos fados que se conhecem, foi composto pelo grande músico do Fado, Jaime Tiago dos Santos .

A origem deste fado, e do seu nome, consta de uma história contada pelo saudoso fadista José de Sousa, que reza assim:

- Certa tarde, em Alcântara, popular bairro de Lisboa, Jaime Santos, durante um convívio com uns amigos do meio fadista, terá desabafado, que nessa noite iria tocar numa verbena no Bairro do Alvito, logo ali ao lado, e dizia repetidamente “...aquilo vai ser uma chatice...”!

No entanto, quando lá chegou, de imediato mudou de opinião, uma vez que os organizadores, avisados dos receios do guitarrista, proporcionaram-lhe uma extraordinária noite de Fado, tratando-o principescamente!

Em resposta, Jaime Santos, após ter reconhecido a avaliação errada que fizera, compôs esta melodia, que dedicou ao Bairro do Alvito e às sua gentes! Talvez por isso, alguns especialistas, também lhe chamem “Fado do Alvito”.

Pequena biografia do autor:

​                                                                                                                                             Jaime Santos

                                                                                                                                                  

​​Jaime Tiago dos Santos, de seu verdadeiro nome Tiago dos Santos, nasceu em

Lisboa,na freguesia de Santa Engrácia, em 01 de Junho de 1909, tendo falecido

também em Lisboa, em 04 de Julho de1982. Descendente de uma família com

tradições fadistas e vocação musical  ( o seu avô materno, de nome Manuel dos

Santos “O jardineiro” , tocava guitarra e cantava Fado e, um seu tio, consta que

era um excelente cantador ).

Ainda muito jovem, com cinco ou seis anos apenas, pegou numa velha guitarra,

e em ação espontânea, dedilhou as cordas do instrumento que o tornaria famoso.

Aos 12 anos, inicia-se no trabalho como aprendiz de marceneiro, altura em que

já  tocava viola, bandolim e violino. Porém, seria a viola o instrumento que, mais

o entusiasmou, e ao qual sededicou no inicio da sua carreira de instrumentista, na qual acompanhou, entre outros, os guitarristas Bento Camacho, Fernando de Freitas, Gonçalves Dias e José Marques (Piscalarete). Um pouco às escondidas, começou a aprender a tocar guitarra! Consta, que o grande empurrão é dado pelo já referido Bento Camacho, que durante uma visita de Jaime Santos a sua casa, e como aquele se demorasse a preparar para irem trabalhar, apanha Jaime Santos a tocar a sua guitarra! Logo aí, e embora não consiga que ele largue a viola, Bento Camacho desafia-o a tocar guitarra, tarefa em que recebe a preciosa ajuda do violista Georgino de Sousa.

Casou com Ofélia, uma das filhas de Georgino de Sousa, violista de Armandinho, tendo sido este quem o incentivou a trocar a viola pela guitarra e o lançou como guitarrista, integrando-o no seu conjunto de guitarras e violas (1937/1938).

É também Georgino de Sousa, que fez com que ele passasse a ser conhecido como Jaime Santos, correspondendo à vontade que Tiago exprimia frequentemente de gostar de se chamar Jaime em vez de Tiago.

Nos dois anos seguintes, junta-se com o violista Miguel Ramos, atuando no Café Luso, na Avenida da Liberdade, em Lisboa.

No ano seguinte, O Retiro da Severa, onde já atuava Armandinho, contrata Jaime Santos! Logo aí se gerou uma tentativa de criar uma rivalidade entre eles! O empresário José Jorge Soreano, promove um confronto público entre os dois com honras de publicidade nos jornais! O tiro saiu-lhes pela culatra, pois ambos rejeitaram a proposta e ambos se despediram da casa onde deveria ter lugar o referido confronto, o Retiro da Severa, tendo saído de braço dado! Assim nasceu uma enorme e sólida amizade.

Em 1944, integra o Conjunto Português de Guitarras, de Martinho d' Assunção, de que também faziam parte, além deste, António Couto e Alberto Correia; em 1945 esses mesmos elementos, decidem formar o Conjunto Típico de Guitarras.

Acompanhou Amália Rodrigues ( período que com algumas interrupções, se prolongou até 1955 ), tendo participado com ela em inúmeros espetáculos quer em Portugal quer no estrangeiro, nomeadamente em Espanha, França, Estados Unidos e México.

Participou no filme “Fado - História Duma Cantadeira” (1947) e ainda nas curtas-metragens de Augusto Fraga sobre temas de fados, filmadas no mesmo ano; em 1954, tem uma intervenção no filme “Les Amants du Tage” na companhia de Santos Moreira.

Fez digressões pelos antigos territórios portugueses da África e pela República da África do Sul, acompanhando Alberto Ribeiro.

Em 1960, com o violista Américo Silva, acompanhou à Holanda a artista Clara de Ovar e, em 1961, foi para Paris durante um ano, atuar na casa típica “O Fado”, de que Clara de Ovar era proprietária.

A partir de 1963, como bom marceneiro, começou a construir e a tocar os seus próprios instrumentos.

Autor das músicas de considerável número de fados ( com letras de diferentes poetas), das quais apresentaremos exemplos, Jaime Santos compôs também diversas variações,

Jaime Santos, foi dos guitarristas que nos deixou um vasto espólio da sua arte, nas imensas gravações fonográficas que nos deixou, sendo o “inventor” das "unhas postiças" , como alternativa às unhas naturais, por questões de resistência e sonoridade, tornando-se numa característica indispensável a todos os guitarristas, até aos dias de hoje.

Seleção de fontes de informação:

http://www.portaldofado.net/content/view/866/327/

Última atualização:  Abril/2009

 

 

 

 

 

Pequena biografia do intérprete::

                                                                                                                                              Fernando Maurício
Fernando da Silva Maurício nasceu em Lisboa na Rua do Capelão, em pleno coração

da Mouraria em 21 de Novembro de 1933.
Oriundo de uma família centenária naquele bairro, com apenas oito anos de idade

cantava já numa taberna da sua rua, o Chico da Severa, onde se reuniam os fadistas

que regressavam das festas de beneficência, então frequentes, onde participavam

graciosamente.
Desses tempos idos da infância recorda com saudade as fugas de casa de seus pais,

nas madrugadas em que “abria o ferrolho, abria a porta pela surdina e ia para a taberna.

Eles (os artistas) iam para ali matar o bicho e de vez em quando tocavam ali um fadinho. Eu tinha uma paixão pela guitarra. Era uma loucura. Punham-me em cima de uma pipa e eu começava para ali a cantar...parecia um papagaio...”
Em 1947, com apenas 13 anos de idade, trabalhava já como manufator de calçado e cantava em associações de recreio quando se organizou, no “Café Latino” o concurso de Fados “João Maria dos Anjos”. Depois de obter um meritório 3º lugar iniciaria, nessa época, com uma autorização especial da Inspeção dos Espetáculos, a sua carreira profissional.
Em 29 de Junho do mesmo ano, participa já na Marcha Infantil da Mouraria representando o Conde Vimioso com Clotilde Monteiro no papel de Severa.
Foi então contratado pelo empresário José Miguel para atuar aos fins-de-semana nas casas que ele, por essa altura explorava, designadamente o “Café Latino”, o “Retiro dos Marialvas”, o “Vera Cruz” e o “Casablanca” no Parque Mayer.
Depois de profissionalizado cantou, nos anos 50 no “Café Luso”, no Bairro Alto, na “Adega Machado” e na casa típica “O Faia”.
Nos anos 60 e 70, casas como a “Nau Catrineta”, a “Kaverna”, “O Poeta”, a “Taverna d’El Rey” e, novamente, o “Café Luso”, conquistaram novos públicos com as atuações daquele a que o destino apelidaria de Rei do Fado. Na década de 80, esta sorte bateria à porta da “Adega Mesquita”.
Durante cerca de 20 anos Fernando Maurício cantou em programas de Fados na Emissora Nacional, atuou na RTP, gravou discos, obteve prémios – Prémio da Imprensa (1969) e os Prémios Prestígio e de Carreira da Casa da Imprensa (1985/1986) – tendo participado em inúmeros espetáculos no estrangeiro: Luxemburgo, Holanda, Inglaterra, Canadá e Estados Unidos.
Da discografia gravada destacam-se, para além dos Fados com Francisco Martinho e da participação em inúmeras coletâneas de Fado, os discos, atualmente disponíveis no mercado: “De Corpo e Alma Sou Fadista” (Movieplay, 1984), “Fernando Maurício, Tantos Fados Deu-me a Vida” (Discossete, 1995), “Fernando Maurício, Os 21 Fados do Rei” (Metro-Som, 1997), “Fernando Maurício”, col. “O Melhor dos Melhores” (Movieplay, 1997) e, finalmente, “Fernando Maurício”, Clássicos da Renascença (Movieplay 2000).
Despreocupado em relação à necessidade de uma regular carreira discográfica, e dotado de um perfil pleno de abnegação e humanismo, Fernando Maurício cantou, durante toda a sua vida, em centenas de festas de beneficência, por todo o país.
Considerado o maior fadista da sua geração, possuidor de uma das mais originais vozes de Fado, a sua vasta carreira fez dele Rei do Fado e da Mouraria.
Recusando os galões, Fernando Maurício manteve-se fiel a uma simplicidade autêntica, preferindo manter-se ligado às raízes, ali mesmo na Mouraria, que visitava diariamente.
Ali revia os amigos da sua juventude: das cantorias, dos bailaricos de Verão, das cegadas na Adega do Luís Saloio, dos passeios pela Praça da Figueira, a ver os magalas e as sopeiras, do futebol, do jogo da Laranjinha e do Rei Mandado, da malandrice, dos banhos no Chafariz da Guia, das correrias a Alfama, da Calçada de Santo André até à Rua da Regueira, das brincadeiras no Tejo, onde aprendeu a nadar.
Desses tempos recorda com saudade: “havia uma padaria na Rua do Capelão onde eu nasci e nós naquela altura - nos anos 40 - dormíamos todos na rua. De manhã levantávamo-nos e íamos lavar a cara ao Chafariz da Guia. Eram muitos amigos que eu tinha. Tínhamos uma equipa de futebol e jogávamos à bola na Rua do Capelão. Entre o Capelão e a Guia. Jogávamos descalços. Nessa padaria havia cestos de verga com pão quentinho, acabadinho de sair do forno. De madrugada, enquanto o padeiro trabalhava, encostávamo-nos à porta e tirávamos uns pães. Era uma época muito má. Corriam os tempos da guerra. Nós éramos 5 irmãos, depois nasceram os dois mais novos. A minha mãe era do Bonfim, do Porto. Lavava roupa para ajudar em casa”.
Aos amigos e à família estima acima de tudo. A filha, Cláudia, a quem Amália Rodrigues costumava apelidar de Rainha Cláudia, é, para Fernando Maurício, motivo de um imenso orgulho.
Com os amigos – o Zé Brasileiro, o Calitas, o Lenine e outros tantos - adora partilhar memórias, perder o tempo em conversas longas, ao sabor de um baralho de cartas, evocando as memórias de um quotidiano vivido no bairro da Mouraria.
Fernando Maurício faleceu a 15 de Julho de 2003.
Observações:
Em Junho de 1989, Amália Rodrigues descerrou, na Rua do Capelão, duas lápides evocativas das vozes emblemáticas da Mouraria - Maria Severa Onofriana e Fernando da Silva Maurício.
Em 31 de Outubro de 1994, a comemoração das bodas de ouro artísticas de Fernando Maurício acontece no Teatro Municipal de S. Luiz, numa Festa de Homenagem promovida pela Câmara Municipal de Lisboa.
Em 12 de Maio de 2001, o Município presta-lhe nova homenagem no Coliseu dos Recreios em Lisboa sendo-lhe atribuído, pela Presidência da República, o título honorífico da Comenda de Bem Fazer.
A 5 de Fevereiro de 2004, num espetáculo intitulado “Boa Noite Solidão”, o Município presta-lhe uma homenagem póstuma no Coliseu dos Recreios de Lisboa, com a participação de inúmeros colegas do Fado. As receitas deste espetáculo revertem na sua totalidade para a família do fadista Fernando Maurício.
Excerto do texto “O Fado é o meu bairro”, Lisboa, CML, 2001; atualizado com informação após o falecimento do fadista.

Seleção de fontes de informação:

http://www.museudofado.pt/personalidades/detalhes.php?id=301

 


Última atualização: Abril/2008

2010 - present

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