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Fado Maria Alice

Padre Nosso (sem carinho)

Letra:            Frederico de Brito               
Música:         Frederico de Brito
Intérprete:      Ercília Costa
 

Sem carinho

de ninguém
Sou andorinha sem ninho
Que nem mesmo beiral tem
Minha vida

faz lembrar
Uma guitarra esquecida
Que ninguém quer dedilhar


Cantar, cantar uma balada tristonha
Para não acordar quem sonha
de ilusões que a vida tem
Eu vou rezando um Padre Nosso baixinho
Para que as pedras do caminho
rezem comigo também

 

 


Neste inferno,

por meu mal
Sou qual barca sem governo
À mercê dum temporal
Sofri tanto,

que nem sei
Se faria um mar de pranto
Tanto pranto que eu chorei

 

 

 

Cantar, cantar uma balada tristonha
Para não acordar quem sonha
de ilusões que a vida tem
Eu vou rezando um Padre Nosso baixinho
Para que as pedras do caminho
rezem comigo também

               

​Pequena biografia do autor e poeta:

                                                                                                                                          Frederico de Brito
Figura emblemática, Frederico de Brito, ou Britinho, - como era mais conhecido

– afirma-se como poeta e compositor de alguns dos temas mais interpretados

no universo fadista, autor de poemas e músicas que refletem uma rara e

peculiar beleza artística.
Joaquim Frederico de Brito nasceu na freguesia de Carnaxide, em Oeiras,

em 1894. Tinha apenas oito anos quando leu o livro “Lira de Fado” de Avelino

de Sousa, sentindo-se de tal forma inspirado que, desde essa altura, começou

a fazer versos para oseu irmão mais velho, João de Brito, cantar em festas de

amadores. Nessa época morava no bairro de Alcântara e a sua juventude

causava dúvidas na autoria de poesia que, posteriormente, se dissiparam quando

o próprio passou a interpretar os versos, como improvisador.
Em entrevista a João Linhares Barbosa para o jornal “Guitarra de Portugal” de 31 de Julho de 1923,
Frederico de Brito conta como começou “trabalhando no repentismo do verso”, há uma dezena de anos na
Ajuda: “Depois de muitos glosamentos, onde o Manuel Maria mostrou o seu valor, (…). Eu, meu caro
Barbosa, senti cá dentro… sabe o quê? Eu lhe digo… a inveja, que n’esse caso é santa. Foi este o toque de clarim, (…). De então fiz-me como você sabe: improvisador”.
Desta forma convenceu os mais incrédulos da sua potencialidade criadora e “iniciou a sua longa carreira de
poeta popular, que até cerca dos 30 anos acumulou com a de cantador, participando em vários espetáculos públicos, como aconteceu com a opereta “História do Fado”, em que atuou como atracão cantando versos seus".
Frederico de Brito foi estucador, taxista e, mais tarde, trabalhou na Companhia de Petróleos Atlantic (depois BP), mas manteve sempre a sua atividade de poeta, escrevendo “em qualquer parte e quando tenho necessidade de o fazer: em casa, na rua, no café, no escritório e até no carro elétrico…” (cf. “Guitarra de Portugal”, 30 de Junho de 1945, pág. 4).
Em 1930 Frederico de Brito publica o livro “Musa ao Volante: quadras”, com prefácio de Albino Forjaz de
Sampaio e dois anos depois, em 1932, “Terra Brava: versos”, desta feita com uma carta prefácio de Teixeira de Pascoais.
Nos alvores da década de 1930, Joaquim Frederico de Brito está entre os autores de fado mais procurados, ao lado de outros grande poetas populares do fado, como Henrique Rego, João da Mata, Linhares Barbosa, Francisco Radamanto, Carlos Conde, Gabriel de Oliveira ou Armando Neves (Nery: 210).
Paralelamente Frederico de Brito tem uma colaboração ativa com um dos mais importantes jornais de
temática fadista, a “Guitarra de Portugal” e, a 1 de Fevereiro de 1941, apresenta-se como diretor e editor do
jornal “O Galarim”.
A partir de 1934, Frederico de Brito torna-se, também, autor de marchas para os bairros de Lisboa. Muitas
das suas criações acabaram por se tornar clássicos das apresentações como é o caso, por exemplo, do tema “É raparigas”, com música de Raul Ferrão, que a Marcha de Benfica apresentou pela primeira vez no desfile de 1934; ou da “Marcha de Marvila de 1963”, com música de Alves Coelho Filho, posteriormente
interpretadas ao longo das décadas seguintes.
A sua extensa produção de poemas para as marchas populares prolonga-se entre os anos de 1934 e 1969, colaborando com os bairros da Ajuda, Alcântara, Alfama, Alto do Pina, Bairro Alto, Benfica, Bica, Campo de Ourique, Campolide, Castelo, Chelas, Graça, Madragoa, Marvila, Mouraria, Olivais, Santa Catarina e São Vicente.
Também no teatro Frederico de Brito deixa a sua marca, estreando-se nesta faceta com a peça “Anima-te
Zé”, apresentada em 1935 no palco do Teatro Maria Vitória. Sucedem-se parcerias na escrita de diversas
revistas, das quais destacamos: “Chuva de Mulheres”, apresentada em 1937 no Éden Teatro, onde Frederico de Brito escreveu os textos com V. de Matos Sequeira, A. Amaral e L. Lauer, a que se aliaram as músicas de C. Calderón e F. Valério (nesta revista Hermínia Silva interpreta o famoso tema “Soldado do Fado”, com letra de Frederico de Brito e música de Frederico Valério); e “Sol e Dó”, levada à cena no Teatro Variedades, em 1943, com textos de Frederico de Brito, C. Alberto, Ascensão Barbosa, A. Nazaré e A. Cruz, e músicas de F. de Carvalho. (cf. Rebello: 88; Sucena: 286).
Ainda neste âmbito, Frederico de Brito, em parceria com José Galhardo e Carlos Lopes, foi autor dos textos da peça “Haja Saúde”, a qual inaugurou o palco do Teatro ABC, no Parque Mayer, em Janeiro de 1956. No decorrer de várias décadas de intensa produção criativa acredita-se que “até ao final da sua longa vida tenha escrito mais de um milhar de letras e várias centenas de músicas.” (Guinot, Carvalho e Osório: 318). Mas deste imenso universo são de destacar as suas criações musicais e poéticas para o fado, de que lembramos os inesquecíveis “Fado do Britinho”, “Fado da Azenha”, “Fado dos Sonhos”, “Biografia do Fado”, “Janela Virada para o Mar”, “Não digam ao fado…”, “Canoas do Tejo” ou “Carmencita”. Os seus fados foram criados e gravados por vozes igualmente consagradas como Carlos Ramos, Tristão da Silva, Amália Rodrigues, Beatriz da Conceição, Carlos do Carmo, Fernanda Maria ou Lucília do Carmo.
Joaquim Frederico de Brito faleceu com 85 anos, deixando um grande legado de criatividade artística, o qual é constantemente recordado, quer pela audição dos intérpretes e criadores originais da sua poesia e música, quer pelas constantes homenagens patentes na interpretação dos seus temas, constantemente revisitados pelas mais jovens gerações do fado.
 

Seleção de fontes de informação:
 

“Guitarra de Portugal”, 31 de Julho de 1923;
“Guitarra de Portugal”, 7 de Junho de 1934;
“Guitarra de Portugal”, 30 de Junho de 1945;
Guinot, M., Carvalho, R., Osório, José Manuel (1999), “Histórias do Fado”, Col. “Um Século de Fado”,
Lisboa, Ediclube;
Nery, Rui Vieira (2004), “Para uma História do Fado”, Lisboa, Público/Corda Seca;
Rebello, Luiz Francisco (1984), “História do Teatro de Revista em Portugal”, Vol. 2, Lisboa, Dom Quixote;
Sucena, Eduardo (1992), “Lisboa, o Fado e os Fadistas”, Lisboa, Vega.
 

Última atualização: Setembro/2009

2010 - present

2010 - present

Pequena biografia da intérprete:                                                                                                                                                                                                                                                                                    Ercília Costa
Ercília Costa nasceu na Costa da Caparica a 3 de Agosto de 1902. Quando tinha

apenas 3 anos a sua família mudou a residência para a Rua Maria Pia, facto que

resultou no grande carinho pelo bairro de Alcântara que a fadista afirmou durante

toda a sua vida.
Para ajudar na subsistência familiar iniciou a profissão de ajudante de costureira,

mas cedo a trocou por uma carreira artística, começando pelo teatro de revista,

onde se apresentou ao lado de grandes vedetas como Luísa Satanella ou Beatriz

Costa, mas realce-se que registou os seus maiores êxitos e consequente

popularidade, na interpretação do Fado.
A entrada de Ercília Costa na vida artística resulta do gosto que desde muito nova tinha em cantar. Ainda
adolescente apresentou-se numa audição, em resposta a um anúncio, para integrar o elenco de uma récita a realizar no Teatro São Carlos. Apesar de ter sido uma das selecionadas o projeto acabou por ser cancelado, mas a qualidade da sua interpretação ficou na memória do Actor Eugénio Salvador, que lhe fez um convite para a Companhia do Teatro Maria Vitória.
Já o seu início de carreira como cantadeira de Fado deu-se no ano de 1927, no Teatro da Trindade, onde fez um dueto com Alberto Reis mas, como revelou Ercília Costa ao jornal “Trovas de Portugal”: “Antes mesmo de cantar o Fado já eu cantava em teatro... Na Companhia Almeida Cruz andei três meses pela província contratada como corista.” (cf. “Trovas de Portugal”, 24 de Junho de 1933)
Em 1930 a fadista vence o 1º prémio de cantadeira, no Concurso de Fados do “Sul América”, uma
organização do jornal “Guitarra de Portugal”. O intérprete masculino vencedor foi Alfredo Marceneiro, com
quem integra, pouco tempo depois, a “Troupe Guitarra de Portugal”, um conjunto de fadistas e
instrumentistas que se disponibilizam para digressões pelo país. A este grupo pertenciam, para além dos já mencionados Ercília Costa e Alfredo Marceneiro, os cantadores Rosa Costa e Alberto Costa, e os
instrumentistas João Fernandes e Santos Moreira.
Ao longo da década de 1930 Ercília Costa, a exemplo do que já vinha acontecendo com Adelina Fernandes, fará parte das fadistas convidadas a apresentar-se regularmente na interpretação do Fado no Teatro de Revista, substituindo as intervenções de atores no Fado e criando assim um espaço próprio de apresentação dos profissionais do Fado, que será seguido por grandes nomes como Berta Cardoso ou Hermínia Silva.
Destacam-se na sua ligação ao Teatro de Revista as peças “Feira da Luz”, levada à cena em 1930 no Teatro da Trindade; “O Canto da Cigarra”, apresentada, no ano seguinte, no Teatro Variedades, onde Ercília Costa fez um grande sucesso com o tema “Fado Lisboa”, de autoria de Álvaro Leal e Raúl Ferrão; ou, ainda, “Fogo de Vistas”, em 1933, no Teatro Avenida; “Fim do Mundo”, em cena no Coliseu dos Recreios, em 1934; e “A Boca do Inferno”, apresentada em 1937 no Teatro Apolo.
A fadista fez, também, algumas aparições no grande écran, nos filmes “Amor de Mãe”, realizado por Carlos Ferreira em 1932, “Amargura”, “Lisboa 1938” e, por último, na longa metragem “Madragoa”, onde
interpretava o papel de mãe do protagonista, personagem a cargo de Carlos José Teixeira. Nesta película de Perdigão Queiroga, estreada em Janeiro de 1952, participavam, ainda, Estevão Amarante, Helga Liné, Silva Araújo, Costinha e a fadista Deolinda Rodrigues.
Ercília Costa exibiu-se ao vivo na rádio, nas emissões da primeira estação de Portugal, a Chiado CT1AA, e em retiros e casas típicas, como o Ferro de Engomar ou o Solar da Alegria, mas cedo teve oportunidade derealizar longas digressões de espetáculos, em Portugal e no estrangeiro.

Assim, logo em 1932, acompanhada por João da Mata, Armandinho e Martinho d’ Assunção, faz
espetáculos na Madeira e nos Açores e, em 1936 faz a sua primeira saída do país, para apresentações no Brasil, iniciando uma série de deslocações de longa duração que a tornarão na primeira fadista a
internacionalizar-se junto das comunidades emigrantes.
Na sua primeira ida ao Brasil fazia parte da Companhia de Vasco Santana e Mirita Casimiro, mas o seu
sucesso foi de tal forma estrondoso que acabou por permanecer uma longa temporada nesse país,
regressando apenas no ano seguinte, em 1937, altura em que Lisboa lhe realizou duas festas de homenagem, uma no salão de chá do Café Chave d’ Ouro e outra no Retiro da Severa.
Ainda nesse mesmo ano de 1937, Ercília Costa vai a Paris, para fazer espetáculos na sala Comédie Française nos Campos Elísios de Paris. Em 1939 desloca-se, a convite do Secretariado de Propaganda de Portugal, aos Estados Unidos, para fazer um espetáculo no Pavilhão Português da Feira Internacional de Nova Iorque, acompanhada por Carlos Ramos.
A esta atuação na grande exposição de Nova Iorque seguem-se dez meses de atuações por inúmeras cidades dos Estados Unidos, apresentando-se a fadista com grande êxito na Califórnia, onde atua em Los Angeles e em Hollywood. Em 1945 faz a sua terceira digressão para atuações no Brasil, a qual dura quinze meses, e passa por espetáculos em teatros, cinemas e atuações na rádio. Nesta temporada Ercília Costa é integrada, como única artista portuguesa, na Companhia de Alda Garrido.
Muitas vezes apelidada de ”Santa do Fado”, por colocar as mãos em posição de oração, Ercília Costa é hoje pouco recordada, fruto possivelmente da falta de reedição em formato CD das muitas gravações que fez, por estas serem datadas da primeira metade do século XX. Neste formato encontra-se apenas disponível uma recolha das suas gravações com Armandinho, editada em 1995 na coleção “Arquivos do Fado” da Tradisom.
As suas primeiras gravações discográficas datam de 1929, altura em que se deslocou a Madrid para gravar para a Odeon, integrando uma comitiva constituída por Berta Cardoso, Joaquim Campos e Cecília de Almeida, sendo todos os fadistas acompanhados pela guitarra portuguesa às mãos de Armandinho e pela viola de Georgino de Sousa. Posteriormente terá também edições discográficas em Portugal, bem como no Brasil e nos Estados Unidos. O seu último registo discográfico, o LP “Museu do Fado” data de 1972.
Ercília Costa popularizou inúmeros temas como: “Amor de Mãe”, “O Meu Filho”, “Fado Tango”, “Fado
Aida”, “Fado Ercília”, “Juro” ou “Fado da Amargura”, sendo também compositora de alguns dos seus
maiores êxitos, caso de “Fado da Mocidade” e de “O Filho Ceguinho”, este último vulgarizado no meio
fadista como o “Menor da Ercília”.
A fadista resolveu dedicar-se inteiramente ao seu casamento e, sem despedidas, retirou-se totalmente da vida artística em 1954. Ercília Costa não fez mais espetáculos ao vivo até à data da sua morte, em 1985.
 

Seleção de fontes de informação:
 

“Guitarra de Portugal”, 17 de Setembro de 1930;
“Trovas de Portugal”, 24 de Junho de 1933;
“Canção do Sul”, 3 de Novembro de 1934;
“Guitarra de Portugal”, 8 de Outubro de 1936;
“Guitarra de Portugal”, 10 de Setembro de 1938;
“Guitarra de Portugal”, 10 de Junho de 1939;
“Canção do Sul”, 1 de Maio de 1940;
“Guitarra de Portugal”, 1 de Julho de 1946;
Machado, Vítor (1937), “Ídolos do Fado”, Tipografia Machado.
 

Última atualização: Abril/2008

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