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História do Fado1
Nascido nos contextos populares da Lisboa oitocentista, o Fado encontrava-se presente nos momentos de convívio

e lazer. Manifestando-se de forma espontânea, a sua execução decorria dentro ou fora de portas, nas hortas, nas

esperas de touros, nos retiros, nas ruas e vielas, nas tabernas, cafés de camareiras e casas de meia-porta.

Evocando temas de emergência urbana, cantando a narrativa do quotidiano, o fado encontra-se, numa primeira fase,

vincadamente associado a contextos sociais pautados pela marginalidade e transgressão, em ambientes frequentados

por prostitutas, faias, marujos, boleeiros e marialvas. Muitas vezes surpreendidos na prisão, os seus atores, os

cantadores, são descritos na figura do faia, tipo fadista, rufião de voz áspera e roufenha, ostentando tatuagens, hábil no

manejo da navalha de ponta e mola, recorrendo à gíria e ao calão. Esta associação do fado às esferas mais marginais

da sociedade ditar-lhe-ia uma vincada rejeição pela parte da intelectualidade portuguesa.


Atestando a comunhão de espaços lúdicos entre a aristocracia boémia e as franjas mais desfavorecidas da população lisboeta, a história do fado cristalizou em mito o episódio do envolvimento amoroso do Conde de Vimioso com Maria Severa Onofriana (1820-1846), meretriz consagrada pelos seus dotes de cantadeira e que se transformará num dos grandes mitos da História do Fado, referencial agregador da comunidade fadista. Em sucessivas retomas imagéticas e sonoras, a evocação do envolvimento de um aristocrata boémio com a meretriz, cantadeira de fados, perpassará em muitos poemas cantados, e mesmo no cinema, no teatro, ou nas artes visuais, desde logo a partir do romance A Severa, de Júlio Dantas, publicado em 1901 e transportado para a grande tela em 1931, naquele que seria o primeiro filme sonoro português, dirigido por Leitão de Barros.
Também em eventos festivos ligados ao calendário popular da cidade, em festas de beneficência ou nas cegadas - representações teatrais de carácter amador e popular, na generalidade representadas por homens, nas ruas, verbenas, associações de recreio e coletividades - o fado ganharia terreno. Apesar deste tipo de representação constituir um divertimento célebre do Carnaval lisboeta, de franca adesão popular e muitas vezes com um vincado carácter de intervenção, a regulamentação da censura em 1927 iria contribuir, de forma lenta mas irreversível, para a extinção deste tipo de espetáculo.


O Teatro de Revista, género de teatro ligeiro tipicamente lisboeta nascido em 1851, cedo descobrirá as potencialidades

do fado que, a partir de 1870 integra os seus quadros musicais, para ali se projetar junto de um público mais alargado.

O contexto social e cultural de Lisboa com seus bairros típicos, sua boémia, assume protagonismo absoluto no teatro

de revista. Ascendendo aos palcos do teatro o fado animará a revista, estruturando-se novas temáticas e melodias.

No teatro de revista, com refrão e orquestrado, o fado será cantado quer por famosas atrizes, quer por fadistas de

renome, cantando o seu repertório. Ficariam na história duas formas diferentes de abordar o fado: o fado dançado e

estilizado por Francis e o fado falado de João Villaret. Figura central da história do Fado, Hermínia Silva consagrou-se

nos palcos do teatro nas décadas de 30 e 40 do Século XX, somando os seus inconfundíveis dotes de cantadeira com

os de atriz cómica e revisteira.
Alargando-se o campo de apropriação do fado a partir do último quartel do séc. XIX, corresponde a esta época a estabilização formal da forma poética da “décima”, quadra glosada em quatro estrofes de dez versos cada, aquela em torno da qual se estruturaria o Fado para mais tarde se desenvolver em torno de outras variantes. Será também neste período que a guitarra, ao longo do século XIX, progressivamente difundida dos centros urbanos para as zonas rurais do país, se definirá na sua componente específica de acompanhamento do fado.
A partir das primeiras décadas do século XX o fado conhece uma gradual divulgação e consagração popular, através da publicação de periódicos que se consagram ao tema, e da consolidação de novos espaços performativos numa vasta rede de recintos que, numa perspetiva comercial, passava agora a incorporar o Fado na sua programação, fixando elencos privativos que muitas vezes se constituíam em embaixadas ou grupos artísticos para efeitos de digressão. Paralelamente, sedimentava-se a relação do Fado com os palcos teatrais, multiplicando-se as atuações de intérpretes de fado nos quadros musicais da Revista ou das operetas.
Com efeito, o aparecimento das companhias de fadistas profissionais a partir da década de 30, veio permitir a promoção de espetáculos, com elencos de grande nomeada e a sua circulação pelos teatros de norte a sul do País, ou mesmo em digressões internacionais. Tal foi o caso do “Grupo Artístico de Fados” com Berta Cardoso (1911-1997), Madalena de Melo (1903-1970), Armando Augusto Freire, (1891-1946) Martinho d’Assunção (1914-1992) e João da Mata e do “Grupo Artístico Propaganda do Fado” com Deonilde Gouveia (1900-1946), Júlio Proença (1901-1970) e Joaquim Campos (1899-1978) ou da “Troupe Guitarra de Portugal”, integrada, entre outros, por Ercília Costa (1902-1985) e Alfredo Marceneiro (1891-1982).


Embora os primeiros registos discográficos produzidos em Portugal datem dos alvores do século XX, o mercado

nacional era ainda, nesta fase, bastante incipiente, uma vez que a aquisição quer de gramofones, quer de discos,

acarretava custos bastante elevados. Efetivamente, depois da invenção do microfone elétrico, em 1925,

reunir-se-iam as condições fundamentais às exigências de captação do registo sonoro. Decorrendo, no mesmo

período, o fabrico de gramofones a preços cada vez mais competitivos, estavam criadas, junto de uma classe

média, as condições mais favoráveis de acesso a este mercado.
No contexto dos instrumentos de mediatização do fado a TSF – telegrafia sem fios - assumiu uma importância

central nas primeiras décadas do século XX. Da intensa atividade de postos de radiodifusão verificada entre 1925 e

1935, destacam-se o CT1AA, o Rádio Clube Português, a Rádio Graça e a Rádio Luso rapidamente popularizada

pelo destaque que deu ao fado. Em 1925 tinham início as emissões da primeira estação de rádio portuguesa, o CT1AA. Investindo nas infraestruturas técnicas e logísticas que lhe garantiam a expansão do seu âmbito de radiodifusão e a regularidade das emissões, o CT1AA de Abílio Nunes passou a integrar o fado nas suas emissões, angariando um vasto círculo de ouvintes, que se estendia à diáspora da emigração portuguesa. Incluindo emissões em direto dos Teatros, bem como apresentações musicais ao vivo nos estúdios, o CT1AA promovendo ainda, a título experimental, a transmissão de um programa de fados da responsabilidade do violista Amadeu Ramin.
Com o golpe militar de 28 de Maio de 1926 e a implementação da censura prévia sobre espetáculos públicos, imprensa e demais publicações, a canção urbana sofreria profundas mutações. De facto, logo no ano seguinte, regulamentando globalmente as atividades de espetáculo através de um extenso clausulado, o Decreto-Lei nº 13 564 de 6 de Maio de 1927, vinha consagrar, ao longo do disposto em 200 artigos, uma “Fiscalização superior de todas as casas e recintos de espetáculos ou divertimentos públicos (…) exercida pelo Ministério da Instrução Pública, por intermédio da Inspeção Geral dos Teatros e seus delegados”. Neste contexto, o fado sofreria inevitavelmente profundas mutações regulado agora, nos termos do disposto naquele instrumento legal, ao nível da concessão de licenças a empresas promotoras de espetáculos, nos mais diversificados recintos, dos direitos de autor, da obrigatoriedade de visionamento prévio de programas e repertórios cantados, da regulamentação específica para a atribuição da carteira profissional, da realização de contratos, deslocações em tournées, entre inúmeros outros aspetos. Impunham-se, assim, significativas mutações no âmbito dos espaços performativos, no modo de apresentação dos intérpretes, nos repertórios cantados – despidos de qualquer carácter de improviso – consolidando-se um processo de profissionalização de uma plêiade de intérpretes, instrumentistas, letristas e compositores, que passava a atuar em recintos diversificados para um público cada vez mais alargado.
Gradualmente, tenderia a ritualizar -se a audição de fados numa casa de fados, locais que iriam sobretudo concentrar-se nos bairros históricos da cidade, com maior incidência no Bairro Alto, sobretudo a partir dos anos 30. Estas transformações na produção do fado irão necessariamente afastá-lo do campo do improviso, perdendo-se alguma da diversidade dos seus contextos performativos de origem e, por outro lado, obrigar à especialização de intérpretes, autores e músicos. Paralelamente, as gravações discográficas e radiofónicas propunham uma triagem de vozes e práticas interpretativas que se impunham como modelos a seguir, limitando o domínio do improviso.
Na década seguinte, vingariam definitivamente as tendências de um revivalismo dos aspetos ditos típicos, que apontavam para a recriação dos aspetos mais genuínos e pitorescos nos ambientes performativos do fado.
E se desde o primeiro momento o fado marcou presença no teatro e na rádio o mesmo irá acontecer na sétima arte. De facto, se o advento do cinema sonoro foi marcado pelo musical, o cinema português consagrou ao fado particular atenção. Ilustra-o bem o facto do primeiro filme sonoro português, realizado em 1931, por Leitão de Barros, ter por temática as desventuras da mítica figura da Severa. Como tema central ou simples apontamento, o fado foi acompanhando a produção cinematográfica portuguesa até à década de 70. Neste sentido, também em 1947 com O Fado, História de uma Cantadeira protagonizado por Amália Rodrigues ou, em 1963, com O Miúdo da Bica, protagonizado por Fernando Farinha, o cinema português consagra particular atenção ao universo fadista. Não obstante o protagonismo de Amália Rodrigues, também neste contexto, são ainda de sublinhar as incursões na Sétima Arte, de artistas como Fernando Farinha, Hermínia Silva, Berta Cardoso, Deolinda Rodrigues, Raul Nery e Jaime Santos.
E se a difusão radiofónica permitira ultrapassar barreiras geográficas, levando a milhares de pessoas as vozes do fado, depois da inauguração da Rádio Televisão Portuguesa - em 1957 – e, sobretudo, com a sua difusão, à escala nacional, em meados da década seguinte, os rostos dos artistas passariam a ser divulgados junto do grande público. Recriando em estúdio ambientes ligados às temáticas fadistas, a televisão transmitiria regularmente, em direto, de 1959 a 1974, programas de fado que contribuiriam de um modo inequívoco para a sua mediatização.
Usufruindo desde o último quartel do século XIX da divulgação nos palcos do Teatro de Revista e, a partir das primeiras décadas do século XX, da promoção de uma imprensa especializada, mediatizando-se progressivamente na Radio, no Cinema e na Televisão, o fado conhece uma franca vitalidade no período compreendido entre as décadas de 1940 e 1960, muitas vezes designado de “anos de ouro”, surgindo em 1953 o concurso da Grande Noite do Fado que se realizará anualmente, até aos nossos dias. Reunindo centenas de candidatos das várias coletividades e agremiações da cidade, este concurso, tradicionalmente realizado no Coliseu dos Recreios mantém-se, ainda hoje, como um evento de grande importância na tradição fadista da cidade e na promoção de jovens amadores que ali tentam ascender ao estatuto profissional.
Os expoentes da canção nacional encontravam-se, nesta época, vinculados a uma rede de casas típicas com elenco residente, usufruindo agora de um mercado de trabalho mais vasto, onde avultam as possibilidades de gravação discográfica, de realização de digressões e tournées, de atuações na rádio e na televisão. Paralelamente, sucediam-se as apresentações de fadistas nos “Serões para Trabalhadores” eventos culturais de cobertura radiofónica promovidos pela FNAT, a partir de 1942, promovendo-se os programas de fado também a partir do Secretariado Nacional de Informação, Cultura e Turismo que, a partir de 1944 passava a tutelar a Censura, a Emissora Nacional e a Inspeção Geral dos Espetáculos. A partir da década de 1950, a aproximação do regime ao prestígio internacional de Amália Rodrigues vinha reforçar esta colagem do regime ao fado, depois de nele operar profundas alterações.
Se a simplicidade da estrutura melódica do Fado valoriza a interpretação da voz, ela sublima também os repertórios cantados. Com forte pendor evocativo, a poesia do fado apela à comunhão entre intérprete, músicos e ouvinte. Em quadras ou quadras glosadas, quintilhas, sextilhas, decassílabos e alexandrinos, esta poesia popular evoca os temas ligados ao amor, à sorte e ao destino individual, à narrativa do quotidiano da cidade. Sensível às injustiças sociais, revestiu-se inúmeras vezes, de um vincado carácter de intervenção.

 

E se as primeiras letras de Fado eram, na sua maioria, anónimas, sucessivamente transmitidas pela tradição oral,

esta situação inverter-se-ia definitivamente a partir de meados da década de 20, época em que surge uma plêiade

de poetas populares como Henrique Rego, João da Mata, Gabriel de Oliveira, Frederico de Brito, Carlos Conde e

João Linhares Barbosa, que consagrará ao fado particular atenção. A partir dos anos 50 do século XX o fado

cruzar-se-á definitivamente com a poesia erudita na voz de Amália Rodrigues. A partir do contributo decisivo do

compositor Alain Oulman, o fado passará a cantar os textos de poetas com formação académica e obra literária

publicada como David Mourão-Ferreira, Pedro Homem de Mello, José Régio, Luiz de Macedo e, mais tarde,

Alexandre O’Neill, Sidónio Muralha, Leonel Neves ou Vasco de Lima Couto, entre muitos outros.
A divulgação internacional do Fado começara já a esboçar-se a partir de meados da década de 30, em direção ao continente africano e ao Brasil, destinos preferenciais para atuação de artistas como Ercília Costa, Berta Cardoso, Madalena de Melo, Armando Augusto Freire, Martinho d’Assunção ou João da Mata, entre outros artistas. Seria, porém, a partir da década de 1950 que a internacionalização do Fado se consolidaria definitivamente sobretudo através da figura de Amália Rodrigues.
Ultrapassando as barreiras da cultura e da língua, com Amália o Fado consagrar-se-ia definitivamente como um ícone da cultura nacional. Durante décadas e até à data da sua morte, em 1999, caberia a Amália Rodrigues, o protagonismo a nível nacional e internacional.
Introduzida em Portugal a partir das colónias inglesas de Lisboa e do Porto, referências de gosto e mentalidade cultural da época, a guitarra inglesa conheceu uma grande divulgação nos salões europeus de meados do século XVIII. De utilização exclusiva nos círculos da burguesia e da nobreza dos salões urbanos, entre meados do século XVIII e 1820, “é nessa qualidade que a vemos associada ao acompanhamento de algumas modinhas e cançonetas italianas de carácter mais erudito (…) no que se refere aos primeiros testemunhos do Fado dançado no Brasil (…) as fontes da época mencionam sempre a viola. O mesmo sucede nas descrições mais antigas do fado de Lisboa (…)” (Cfr. NERY, Rui Vieira, Para uma História do Fado, Lisboa, Publico/Corda Seca, 2004, p. 98).
A partir do início do novo século vai surgindo nas fontes históricas a designação “guitarra portuguesa” atestando possivelmente o modelo de seis pares de cordas, uma alteração provavelmente introduzida em Portugal e, será sobretudo a partir de 1840, que surgem notícias da sua associação ao contexto performativo fadista onde assumirá um plano de absoluta centralidade.
Na história da construção da guitarra portuguesa, inteiramente artesanal, distinguem-se duas famílias de guitarreiros que aperfeiçoaram e transmitiram o seu segredo ao longo de sucessivas gerações. A primeira inicia-se com Álvaro da Silveira e é continuada por Manuel Cardoso e seu filho Óscar Cardoso. A segunda nasce com João Pedro Grácio e mantém-se com João Pedro Grácio Júnior, que se destaca de seis irmãos, e seu filho Gilberto Grácio. O diálogo permanente entre esta oficina e os executantes que a preferiram, como Luís Carlos da Silva, Petrolino, Armando Freire, Artur Paredes, Carlos Paredes, José Nunes, foi fundamental á evolução técnica e acústica do instrumento.
De entre os guitarristas, Armando Augusto Freire, também conhecido por Armandinho (1891-1946) foi autor de inúmeros fados e variações, deixando uma escola da qual saíram, entre outros, Jaime Santos, Carvalhinho, Raúl Nery e José Fontes Rocha.
No que se refere aos conjuntos de guitarras, ficaram como referência os conjuntos do Professor Martinho d’Assunção, proeminente violista e compositor e o conjunto de guitarras de Raúl Nery criado a convite da Emissora Nacional e formado pelo próprio Raúl Nery como primeiro guitarra, José Fontes Rocha – segundo guitarra - Júlio Gomes –viola - e Joel Pina –viola baixo.
A revolução de Abril de 1974 veio instaurar um Estado democrático em Portugal, fundado no pressuposto da integração das liberdades públicas, no respeito e garantia dos direitos individuais, com a inerente abertura, aos cidadãos, de uma mais ativa participação cívica, política e social. Progressivamente, ao longo das décadas seguintes, far-se-ão sentir as influências da cultura de massas, próprias de uma sociedade da era da globalização, contexto que modificará a relação do fado com o mercado português, que se concentra agora na música popular de carácter interventivo absorvendo, simultaneamente, muitas das formas musicais criadas no estrangeiro.
Nos anos imediatamente seguintes à revolução a interrupção, por dois anos, do concurso da Grande Noite do Fado, ou a diminuição radical da presença do fado em emissões radiofónicas ou televisivas, atestam bem a hostilidade ao fado.

 

De facto, só a estabilização do regime democrático devolveria ao fado o seu espaço próprio a partir de 1976 e, logo

no ano seguinte, vinha a lume o álbum Um Homem na Cidade por um dos maiores expoentes da canção urbana de

Lisboa, figura central da internacionalização do fado, autor de uma sólida carreira de 45 anos, ao longo da qual tem

articulado, como ninguém, a tradição fadista mais legítima, a uma inesgotável capacidade de a recriar.
Encerrando-se gradualmente o debate ideológico em torno do fado, será sobretudo a partir da década de 1980 que

terá lugar o reconhecimento do lugar central do fado consenso, no quadro do património musical português,

assistindo-se a um renovado interesse do mercado pela canção urbana de Lisboa, como o atestam a atenção

crescente da indústria discográfica, através, nomeadamente de reedições de registos gravados, a gradual integração

do fado nos circuitos dos festejos populares, à escala regional, o aparecimento progressivo de uma nova geração de

intérpretes, ou ainda a aproximação ao fado de cantores de outras áreas como José Mário Branco, Sérgio Godinho,

António Variações ou Paulo de Carvalho.
Emergindo, no plano internacional um renovado interesse pelas culturas locais musicais, através dos seus expoentes mais reconhecidos, nos circuitos do disco, dos média e dos espetáculos ao vivo, Amália Rodrigues e Carlos do Carmo assumem destaque absoluto.
Já nos anos 90 o fado consagrar-se-ia, definitivamente nos circuitos da World Music internacional com Mísia e Cristina Branco, respetivamente no circuito francês e na Holanda. Também nos anos 90, um outro nome que se destaca no panorama do Fado é Camané, com grande consagração. Desde a década de 90 e já no dealbar do século surge uma nova geração de talentosos intérpretes como Mafalda Arnauth, Kátia Guerreiro, Maria Ana Bobone, Joana Amendoeira, Ana Moura, Ana Sofia Varela, Pedro Moutinho, Helder Moutinho, Gonçalo Salgueiro, António Zambujo, Miguel Capucho, Rodrigo Costa Félix, Patrícia Rodrigues, ou Raquel Tavares. No circuito internacional porém, Mariza assume protagonismo absoluto, desenhando um percurso fulgurante, ao longo do qual tem legitimamente colhido sucessivos prémios na categoria de World Music.
Excertos do texto:
Pereira, Sara (2008), “Circuito Museológico”, in Museu do Fado 1998-2008, Lisboa: EGEAC/Museu do Fado.

Seleção de fontes de informação:
http://www.museudofado.pt/gca/index.php?id=17



História do Fado2
Nos finais do séc. XVII, as "modinhas" brasileiras estavam em voga em Lisboa. É Caldas Barbosa, "poeta
cantador de modinhas", nascido em 1740, filho de uma escrava angolana e de um português, que introduz nos salões de Lisboa, uma nova cantiga toda de "suspiros" e "ais", mistura da "modinha" com o doce "Lundum".

Só depois de 1840 é que o fado aparece como música popular, com um ritmo particular, tocado na guitarra e que tem por letra os poemas chamados "Fados".

Ao longo dos tempos, o fado tem passado por diversas fases.
 

 

• 1840 a 1869 - Fase Popular
Numa 1ª fase, que ocorre entre 1840 e 1869, o fado é popular e espontâneo, é executado nas tabernas e vielas,

está associado à prostituição e à vadiagem e transmite melancolia, tristeza, medo e amargura, características

desta camada da população.

 

• 1869 a 1930 - Fase Aristocrática
Inicia-se em 1868/1869 e é considerada uma fase aristocrática e literária, em que as origens humildes do fado,

nas vielas e tascas de Lisboa na voz de rufias e rameiras, não tardou a conquistar adeptos entre a burguesia e

nobreza que se deslocavam até os bairros pobres e degradados de Lisboa, onde se misturavam com o povo nas

tabernas e nas coletividades e que vão levar o fado a ser executado nos salões dos palácios. No seio da burguesia,

a simplicidade das cordas da guitarra foi trocada pelo piano. As pautas das canções passaram a ser vendidas e as

senhoras da alta-roda, ouviam emocionadas, o fado nos salões.

• 1930 a 1974 - Período Glorioso
No princípio do séc. XX, o fado começou a ser apresentado no teatro de revista, deixando de ter a sua característica de improvisação, para o que muito contribuiu o período da ditadura de Salazar (1932-1968), que sujeitava as letras à censura e exigia aos profissionais uma licença para o exercício da profissão.
Entre os anos 30 e 50 o fado viveu um período glorioso, que coincidiu igualmente com o aparecimento da rádio,

proporcionando desta forma a divulgação do fado de forma muito mais ampla e eficaz.
Com o aparecimento do cinema sonoro, o fado rapidamente se introduziu no meio, protagonizando momentos

tão célebres, como Amália no filme "O Fado - História de uma Cantadeira", de Perdigão Queiroga, ou o "Fado

do Estudante", cantado por Vasco Santana, na "Canção de Lisboa" de Cottinelli Telmo.
Aos poucos implementou-se uma espécie de "star system", com as suas maiores vozes a serem consideradas

como ídolos populares.
 

Muitos artistas talentosos apareceram na época - Maria Alice, Hermínia Silva, Júlio Proença, Carlos Ramos,

Max, Fernando Maurício, Maria Teresa de Noronha, Alfredo Marceneiro, Amália Rodrigues e outros mais.
Apareceu igualmente uma interessante geração de guitarristas e violistas, sendo muitos os mestres de

guitarra portuguesa que deram nas vistas como acompanhantes da voz ou em devaneios instrumentais. Entre outros, 

surgiram, Petrolino, Armandinho, Piscalarete, Salvador Freire, Artur Paredes, Raul Nery, Fontes Rocha, Jaime

Santos, António Chainho, sendo o mais genial de todos, Carlos Paredes - com uma semântica própria, totalmente

autónoma do fado, com uma obra notável, que o transforma num dos melhores compositores portugueses.

 

• 1975 - 1990 - Crise
A seguir ao 25 de Abril, o fado entrou em crise, devido ao desinteresse do público.
Nos anos 70 essa crise é provocada por fatores políticos. A conotação que o fado tinha com o regime salazarista e o espírito progressista da revolução não se identificava com uma música saudosista, tradicionalista e virada para o passado.
Durante os anos 80 essa crise manteve-se, já não relacionada com a questão política pois a geração daqueles que

são adolescentes ou jovens adultos nesta década tem um perfil distinto: o 25 de Abril é uma fábula distante e um

valor assegurado, e estão mais interessados em divertir-se descomprometidamente do que a cantar canções

revolucionárias ou debater questões ideológicas complexas. É de referir que os anos 80 também coincidem com a

estabilização do regime pós 25 de Abril e do início da crise das ideologias que culminou com a queda do Muro de

Berlim. Estamos perante uma sociedade capitalista e consumista, em plena crise de valores e sob influência da

cultura anglo-saxónica - estavam assim criadas as condições para uma explosão de bandas de rock portuguesas.
Essa geração de 80, ao mesmo tempo que repudiava a música de intervenção dos anos 70, continuava a considerar

o fado como retrógrado, herança e símbolo do regime salazarista, por um lado e música triste e nostálgica, contrastante com espírito festivo e futurista do rock, por outro.
 

• 1990 - 2005 - Revivalismo
Esta crise só viria a desaparecer já na 2ª metade da década de 90, quando o contributo de fadistas como

Mísia e Paulo Bragança rompem com os preconceitos existentes, através de uma alteração estética, ao

nível musical, poético, do vestuário, do discurso e postura em palco.
De igual forma, vem influenciar esta alteração de atitude face ao fado, uma influência de um movimento

de fora para dentro: o fado é ouvido, editado e premiado no estrangeiro. Há um movimento internacional

de resposta à globalização e à massificação do mercado. Isso faz com que todas as tradições

potencialmente identitárias sejam valorizadas localmente.
Esta nova atitude abre caminho a um novo rumo do fado, caracterizado nas interpretações de: Camané,

Dulce Pontes, Teresa Salgueiro, Mariza, Mafalda Arnauth entre outros.
  
Seleção de fontes de informação:
http://ofado.no.sapo.pt/03_Historia.htm




História do Fado3
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
O fado é um estilo musical português. Geralmente é cantado por uma só pessoa (fadista) e acompanhado por

guitarra clássica (nos meios fadistas denominada viola) e guitarra portuguesa. O fado foi elevado à categoria

de Património Oral e Imaterial da Humanidade pela UNESCO numa declaração aprovada no VI Comité

Intergovernamental desta organização internacional, realizado em Bali, na Indonésia, entre 22 e 29 de

Novembro de 2011.
 

Origem
A palavra fado vem do latim fatum, ou seja, "destino", é a mesma palavra que deu origem às palavras fada, fadário, e "correr o fado".
Uma explicação popular para a origem do fado de Lisboa remete para os cânticos dos Mouros, que permaneceram no bairro da Mouraria, na cidade de Lisboa após a reconquista Cristã. A dolência e a melancolia, tão comuns no Fado, teriam sido herdadas daqueles cantos. No entanto, tal explicação é ingénua de uma perspetiva etnomusicológica. Não existem registos do fado até ao início do século XIX, nem era conhecido no Algarve, último reduto dos árabes em Portugal, nem na Andaluzia onde os árabes permaneceram até aos finais do século XV.
"Na Irlanda, o cantor ou vate tinha o nome de Faith, e no tempo de Francisco I, Fatiste era o compositor «de jeux et novalistés » em que se vê a transição para a forma dramática, e a importância que merece entre nós o nome de Fadista dado ao cantor popular.”
Uma outra origem é do escandinavo "fata", que significa vestir, compor, que teria dado origem, segundo outra teoria, no francês antigo ao termo "fatiste" que significa poeta."Assim podemos ver que o fado é uma degeneração da xácara, que pelas transformações sociais, veio a substituir a canção de gesta da idade média".

 

Numa outra teoria, também não completamente provada, a origem do fado parece despontar da imensa popularidade nos séculos XVIII e XIX da Modinha, e da sua síntese popular com outros géneros afins, como o Lundu. No essencial, a origem do fado é ainda desconhecida, mas certo é, que surge no rico caldo de culturas presentes em Lisboa, sendo por isso uma canção urbana.

No entanto o fado só passou a ser conhecido depois de 1840, nas ruas de Lisboa. Nessa época só o fado do marinheiro era conhecido, e era, tal como as cantigas de levantar ferro as cantigas das fainas, ou a cantiga do degredado, cantado pelos marinheiros na proa do navio. O fado mais antigo é o fado do marinheiro, e é este fado que vai se tornar o modelo de todos os outros géneros de fado que mais tarde surgiriam como o fado corrido que surgiu a seguir e depois deste o fado da cotovia. E com o fado surgiram os fadistas, com os seus modos característicos de se vestirem, as suas atitudes não convencionais, desafiadoras por vezes, que se viam em frequentes contendas com grupos rivais. Um fadista, ou faia, de 1840 seria reconhecido pela sua maneira de trajar: " Usava boné de oleado com tampo largo, e pala de polimento, ou boné direito do feitio dos guardas municipais, com fita preta formando laço ao lado e pala de polimento; jaqueta de ganga ou jaqueta com alamares."

" O seu penteado[]consistia em trazer o cabelo cortado de meia cabeça para trás, mas comprido para

diante, de maneira que formasse melenas ou belezas, empastadas sobre a testa."

Na primeira metade do século XX, já em Portugal, o fado foi adquirindo grande riqueza melódica e

complexidade rítmica, tornando-se mais literário e mais artístico. Os versos populares são substituídos

por versos elaborados e começam a ouvir-se as décimas, as quintilhas, as sextilhas, os alexandrinos e

os decassílabos.

Durante as décadas de 30 e 40, o cinema, o teatro e a rádio vão projetar esta canção para o grande

público, tornando-a de alguma forma mais comercial. A figura do fadista nasce como artista. Esta foi a

época de ouro do fado onde os tocadores, cantadores saem das vielas e recantos escondidos para

brilharem nos palcos do teatro, nas luzes do cinema, para serem ouvidos na rádio ou em discos.

Surgem então as Casas de Fado e com elas o lançamento do artista de fado profissional. Para se poder

cantar nestas Casas era necessário carteira profissional e um repertório visado pela Comissão de Censura, bem como, um estilo próprio e boa aparência. As casas proporcionavam também um ambiente de convívio e o aparecimento de letristas, compositores e intérpretes.
Já em meados do século XX o fado iniciou sua conquista pelo mundo, tornando-se muito famoso também fora de Portugal.
Os artistas que cantam o fado trajavam de negro. É no silêncio da noite, com o mistério que a envolve, que se deve ouvir, com uma "alma que sabe escutar", esta canção, que nos fala de sentimentos profundos da alma portuguesa. É este o fado que faz chorar as guitarras…
O fadista canta o sofrimento, a saudade de tempos passados, a saudade de um amor perdido, a tragédia, a desgraça, a sina e o destino, a dor, amor e ciúme, a noite, as sombras, os amores, a cidade, as misérias da vida, critica a sociedade…
O nascimento do fado em Lisboa
Na segunda metade do século XIX, surge em Lisboa, embalado nas correntes do romantismo, uma melopeia que tanto exprimia a tristeza unânime de um povo e a desilusão deste para com o ambiente instável em que vivia, como abria faróis de esperança sobre o quotidiano das gentes mais desfavorecidas e, mais tarde, penetrava ainda nos salões da aristocracia, tornando-se rapidamente uma expressão musical nacional.
A sua origem histórica é incerta e não é uma importação mas antes uma criação que surge de uma mistura cultural que ocorreu em Lisboa.
O musicólogo Rui Vieira Nery, considera que a história do fado tem início bem longe de Lisboa mas o investigador Paulo Caldeira mostra mais acuidade com as afirmações ao demonstrar que o fado começou por ser cantado nas chamadas "Casas de Fado", como Alfama, Castelo, Mouraria, Bairro Alto, Madragoa, e as suas origens boémias e ordinárias, baseadas nas tabernas e bordéis, nos ambientes de orgia e violência dos bairros mais pobres e violentos da capital, tornavam o fado condenável aos olhos da Igreja, que desde cedo tentou impedir a evolução de tal movimento.
Porém, é com a penetração da fidalguia nos bairros do castelo, com a presença constante dos cavalheiros e mesmo fidalgos titulares, que o fado se torna presença nos pianos dos salões aristocráticos. Tais nobres que se aventuravam naquele ambiente bairrista foram traduzindo as melodias da guitarra para as pautas das damas de sociedade, que até ali só investiam nas modinhas. Tal investidura levou a que o fado, ao passar da década de 1880, se tornasse assíduo dos salões.
As guerras civis da metade do século criaram um clima de insegurança que envolveu as vicissitudes a vida parlamentar e política, despertando na voz popular a adesão maior ao fado e ao regozijo que este lhe trazia.
Amália, Arte de Rua em Lisboa.
As tabernas, primordialmente, eram palco de encontros de fidalgos, artistas, trabalhadores da hortas, populares e estrangeiros, que se reuniam em noites de fado vadio, ou seja, o fado não profissional.
A primeira cantadeira de fado de que se tem conhecimento foi Maria Severa Onofriana que cantava e tocava guitarra

nas ruas da Mouraria, especialmente na Rua do Capelão. Era amante do Conde de Vimioso e o romance entre

ambos é tema de vários fados.
Mas é com início do século XX que nasce Ercília Costa, uma fadista quase esquecida pelas vicissitudes do tempo,

que foi a primeira fadista com projeção internacional e a primeira a galgar fronteiras de Portugal.
Os temas mais cantados no fado são a saudade, a nostalgia, o ciúme, as pequenas histórias do quotidiano dos

bairros típicos e as lides de touros. Eram os temas permitidos pela ditadura de Salazar, que permitia também o fado

trágico, de ciúme e paixão resolvidos de forma violenta, com sangue e arrependimento. Letras que falassem de

problemas sociais, políticos ou quejandos eram reprimidas pela censura.
Deste fado "clássico" (?) são expoentes mais recentes Carlos Ramos, Alfredo Marceneiro, Maria Amélia Proença, Berta Cardoso, Maria Teresa de Noronha, Hermínia Silva, Fernando Farinha, Fernando Maurício, Lucília do Carmo, Manuel de Almeida, entre outros.
O fado moderno (?) iniciou-se e teve o seu apogeu com Amália Rodrigues. Foi ela quem popularizou fados com letras de grandes poetas, como Luís de Camões, José Régio, Pedro Homem de Mello, Alexandre O’Neill, David Mourão-Ferreira, José Carlos Ary dos Santos e outros, no que foi seguida por outros fadistas como João Ferreira-Rosa, Teresa Tarouca, Carlos do Carmo, Beatriz da Conceição, Maria da Fé, Mísia. Também João Braga tem o seu nome na história da renovação do fado, pela qualidade dos poemas que canta e música, dos autores já citados e de Fernando Pessoa, António Botto, Affonso Lopes Vieira, Sophia de Mello Breyner Andresen, Miguel Torga ou Manuel Alegre, e por ter sido o mentor de uma nova geração de fadistas. Acompanhando a preocupação com as letras, foram introduzidas novas formas de acompanhamento e músicas de grandes compositores: com Amália é justo destacar Alain Oulman (um papel determinante na modernização do suporte musical do fado), mas também Frederico de Freitas, Frederico Valério, José Fontes Rocha, Alberto Janes, Carlos Gonçalves.
Nascido em Lisboa o fado tornou-se rapidamente numa canção nacional[8] que é hoje conhecido mundialmente pode ser (e é muitas vezes) acompanhado por violino, violoncelo e até por orquestra, mas não dispensa a sonoridade da guitarra portuguesa, de que houve e ainda há excelentes executantes, como Armandinho, José Nunes, Jaime Santos, Raul Nery, José Fontes Rocha, Carlos Gonçalves, Pedro Caldeira Cabral, José Luís Nobre Costa, Ricardo Parreira, Paulo Parreira ou Ricardo Rocha. Também a viola é indispensável na música fadista e há nomes incontornáveis, como Alfredo Mendes, Martinho d'Assunção, Júlio Gomes, José Inácio, Francisco Perez Andión, o Paquito, Jaime Santos Jr., Carlos Manuel Proença. Obrigatório é mencionar um virtuoso da guitarra clássica que se especializou em viola de Fado, Artur Caldeira, e o expoente máximo da "escola antiga", o viola-baixo de Fado, Joel Pina, o "Professor".
Atualmente, muitos jovens – Dulce Pontes, Cuca Roseta, Marco Rodrigues, Ana Moura, Carminho, Rodrigo Costa Felix, Raquel Tavares, Hélder Moutinho, Maria Ana Bobone, Mariza, Yolanda Soares, Joana Amendoeira, Mafalda Arnauth, Miguel Capucho, Ana Sofia Varela, Marco Oliveira, Kátia Guerreiro, Luísa Rocha, Camané, Aldina Duarte, Gonçalo Salgueiro, Diamantina, Ricardo Ribeiro, Cristina Branco , António Zambujo - juntaram o seu nome aos dos consagrados ainda vivos e estão dando um fôlego incrível a esta canção urbana.
O fado dito "típico" é hoje em dia cantado principalmente (?) para turistas, nas "casas de fado" e com o acompanhamento tradicional. As mais tradicionais casas de fado encontram-se nos bairros típicos de Alfama, Mouraria, Bairro Alto e Madragoa. Mantém as características dos primórdios: o cantar com tristeza e com sentimento mágoas passadas e presentes. Mas também pode contar uma história divertida com ironia ou proporcionar um despique entre dois cantadores, muitas vezes improvisando os versos – então, é a desgarrada.
No dia 27 de Novembro de 2011, a UNESCO declarou o Fado Património Imaterial da Humanidade. A candidatura apresentada pela delegação portuguesa foi aceite, em Bali, durante o VI Comité Intergovernamental desta Organização da ONU.

 

Século XX
No século XX vive-se em plena censura no regime salazarista e uma licença era exigida aos fadistas e instrumentistas e as letras e os poemas eram sujeitos a uma censura rigorosa. O século XX é a época de ouro do fado, este é projetado para o grande público, o fadista deixa de se limitar às tabernas e vielas e surge nos palcos do teatro, no cinema, na rádio e em discos, saltando para o teatro de Revista. Aparece-nos as chamadas Casa de fados e o fadista passa a ser considerado artista profissional, com estilo próprio e boa aparência, trajado de negro como a escuridão da noite silenciosa. Este novo meio é propício ao aparecimento de letristas, compositores e intérpretes. Na primeira metade do século XX aparece-nos Ercília Costa a primeira fadista portuguesa de projeção internacional apelidada de "Sereia peregrina do Fado", "Santa do Fado" e "Toutinegra do Fado”. Empurrado para as luzes da ribalta pelo cinema, rádio e mais tarde televisão, o Fado, era adorado por todos, não havendo quase português que não o ouvisse. Ainda há pouco cantado nas tabernas e nos pátios dos bairros populares, como Alfama, Castelo, Mouraria, Bairro Alto, Madragoa, torna-se a alma portuguesa. É neste século na década de 50 que surge Amália

Rodrigues, conhecida nacional e internacionalmente como a maior fadista de todos os tempos e pioneira do fado

moderno.
 

Anos 60 e 70
Até ao 25 de Abril, o Fado era a alma nacional, a canção do momento que representava as tristezas e angústias

da alma portuguesa e a sua queda para o fatalismo. Quando se deu o 25 de Abril de 1974 aparecem-nos as

canções de intervenção que ao invés do fatalismo apelavam à esperança de um povo oprimido e crença na liberdade

e estas tiveram uma adesão imediata por parte da população, surgindo-nos personalidades como Adriano Correia

de Oliveira, José Afonso mais conhecido como Zeca Afonso, Luís Cília, Manuel Freire, José Mário Branco, José

Barata Moura, Sérgio Godinho, Carlos Alberto Moniz, Maria do Amparo, Teresa Paula Brito, Fausto, Carlos Paredes

e muitos outros e o fado é marginalizado, é posto à margem, afastado, é retirado do pedestal e é um pouco desvalorizado para dar lugar às canções que exaltam a esperança e anseiam pela liberdade, que eram cantadas tanto pelos cantores e fadistas de Lisboa como em Coimbra.[
 

O Fado de Coimbra

Grupo de fados Verdes Anos
Muito ligado às tradições académicas da respetiva Universidade, o Fado de Coimbra  tem as suas origens nos

estudantes de todo o país que levavam as suas guitarras para Coimbra e, como ainda hoje se assiste, é

exclusivamente cantado por homens e tanto os cantores como os músicos usam o traje académico: calças e

batina pretas, cobertas por capa de fazenda de lã igualmente preta. Canta-se à noite, quase às escuras, em

praças ou ruas da cidade. O local mais típico é na praça junto ao Mosteiro da Sé Velha. Também é tradicional

organizar serenatas, em que se canta junto à janela da casa da dama que se pretende conquistar.
O Fado de Coimbra é acompanhado igualmente por uma guitarra portuguesa e uma guitarra clássica (também

aqui chamada "viola"). No entanto, a afinação e a sonoridade da guitarra portuguesa são, em Coimbra, diferentes

das do fado de Lisboa na medida em que as cordas são afinadas um tom abaixo, e a técnica de execução é

diferente por forma a projetar o som do instrumento nos espaços exteriores, que são o palco privilegiado desta

canção. Também a guitarra clássica se deve afinar um tom abaixo. Esta afinação pretende transmitir à música uma sonoridade mais soturna, relativamente ao Fado de Lisboa.
Temas mais glosados: os amores estudantis, o amor pela cidade, e outros temas relacionados com a condição humana. Dos cantores ditos "clássicos", destaques para Augusto Hilário, António Menano, Edmundo Bettencourt.
Nos anos 1950 do Século XX iniciou-se um movimento que levou os novos cantores de Coimbra a adotar a balada e o folclore. Começaram igualmente a cantar grandes poetas, clássicos e contemporâneos, como forma de resistência à ditadura de Salazar. Neste movimento destacaram-se nomes como Adriano Correia de Oliveira e José Afonso (Zeca Afonso), que tiveram um papel preponderante na autêntica revolução operada desde então na Música Popular Portuguesa.
No que respeita à guitarra portuguesa, Artur Paredes revolucionou a afinação e a forma de acompanhamento da Canção de Coimbra, associando o seu nome aos cantores mais progressistas e inovadores. (Artur Paredes foi pai de Carlos Paredes, que o seguiu e que ampliou de tal forma a versatilidade da guitarra portuguesa que a tornou um instrumento conhecido em todo o mundo.)
Saudades de Coimbra ("Do Choupal até à Lapa"), Balada da Despedida do 6º Ano Médico de 1958 ("Coimbra tem mais encanto, na hora da despedida", os primeiros versos, são mais conhecidos do que o título), O meu menino é d’oiro Fado Hilário e Samaritana – são algumas das mais conhecidas Canções de Coimbra.
A canção mais conhecida é Coimbra é uma lição, que teve um êxito assinalável em todo o mundo com títulos como Avril au Portugal ou April in Portugal, levada pelas mãos de Amália.

 

Seleção de fontes de informação:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Fado

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Silêncio que se vai cantar o Fado…

 

Segundo Vieira Nery, “O primeiro aspecto a constatar na procura das raízes históricas do Fado é a de que até ao final do século XVIII não conhecemos uma única fonte escrita portuguesa em que esta 

palavra seja utilizada com qualquer conotação musical”.

 

Antes do início do século XIX a palavra Fado era unicamente utilizada com o significado da sua raiz 

latina fatum – o destino, a sina. Com esse significado, aparece em textos de poetas e escritores, 

como exemplo, o belíssimo poema de Luís de Camões (1524-1580)

 

Com que voz chorarei meu triste fado,

que em tão dura paixão me sepultou.

Que mor não seja a dor

que me deixou o tempo,

de meu bem desenganado

 

Ou como este outro de Bocage (1765-1805)

 

Mas no bojo voraz da desventura,

Monstro por cujas fauces fui tragado

Em parte um pensamento a dor me cura

O infeliz (não por culpa, só por fado)

Naqueles corações em que há ternura

É mais interessante, é mais amado

 

O Fado emergiu em Lisboa como forma musical reconhecível. Os portos de mar sempre foram lugares de

partida e de chegada de pessoas e mercadorias. Nos mesmos barcos vinham também outras culturas, outras

sonoridades, outras músicas. Em Lisboa, o som do lundum e das modinhas pairava. Era a fusão musical 

do chegar e do partir.

A história do Fado português é um longo processo de trocas interculturais. No contexto multicultural do 

Brasil colonial, os ritmos e os padrões de dança africanos combinam-se com as harmonias e as formas 

europeias para gerar uma dança cantada de forte sensualidade que atravessa o Atlântico para se implantar 

nos bairros populares do porto de Lisboa. A interacção entre o modelo brasileiro e as tradições locais da canção

portuguesa leva gradualmente a um desaparecimento do elemento de dança e à atenuação do ritmo 

sincopado original, que dão agora lugar a uma atmosfera nostálgica e lamentatória, com um forte rubato 

na declamação do poema.

 

As primeiras referências ao fado de Lisboa remontam às décadas de 1820 e 1830. 

Em 26 de julho de 1820 nasce  Maria Severa Onofriana (1820-1846) –o fado ganha, então, a sua emblemática 

“figura fundacional”: a Severa.

Severa, prostituta de profissão, e consagrada pelos seus dotes de cantadeira, transformou-se numa das

personagens míticas da história do fado.

Foi uma representante significativa do ambiente a que o fado estava associado numa primeira fase: à 

prostituição, com todo o ambiente social e espacial, às tavernas, às casas de passe, ao marujo, ao vagabundo, ao proxeneta e ao fadista, que se integrava perfeitamente neste contexto. Este estava associado à imoralidade, 

à marginalidade – um canalha.

 

O fado aparece no grupo mais pobre da população, sem trabalho regular nos bairros mais antigos e 

degradados, quase labirínticos, onde a falta de luz permitia esconder a marginalidade.

As letras dos fados eram transmitidas oralmente e tinham como objecto os episódios da vida quotidiana 

marginal: os crimes, as mortes anunciadas, as catástrofes naturais, assim como a vida do bairro ou

os males de amor.

 

 

Com uma estrutura melódica muito simples, o fado valorizava a interpretação de quem cantava/contava, 

apelando à comunhão entre o intérprete, músicos e ouvintes. Daí a frase que ainda hoje ouvimos: “É tão

fadista quem canta como quem ouve!”

 

 

 

Entre o fado em tom menor chorado e triste e o ritmo veloz, irónico e brejeiro do fado corrido,  com quadras e 

quintilhas ou sextilhas e decassílabos, a poesia popular tinha o seu lugar e acontecia o fado.

Permitam-me um parêntesis, para dizer que o “Menor” e o “Corrido” fazem parte de uma “tríade” famosa, 

juntamente com o “Mouraria” 

 

São fados predominantemente em dois tons, dos mais básicos do repertório fadista de todos os tempos. 

O “Mouraria” é o preferido para improvisar despiques entre fadistas, para cantar “à desgarrada”. 

Dada a facilidade da estrutura musical destes três fados (permitindo que sejam acompanhados por qualquer 

músico, ou mesmo apenas à viola) e servidos por letras “em quadra” (a forma poética mais popular), 

tornaramse “referência obrigatória” para todos os intervenientes no “ato fadista – cantores/declamadores,

músicos, público. Ainda hoje, apesar do seu carácter extremamente elementar, que nos remete diretamente 

aos primórdios do fado, uma noitada fadista sem o “Menor”, o “Corrido” ou o “Mouraria” 

é absolutamente improvável.

 

Fechado o parêntesis, diga-se que nesse passado longínquo associavam-se ao fado o tabaco, o vinho, a voz ápera e rouca. O fado, mais que qualquer coisa que se cantava, era sobretudo algo que se contava e improvisava.

Os vários acontecimentos políticos de projecção nacional que ocorreram nas últimas décadas do século XIX, passando pela queda da monarquia e implantação da Républica em 1910, resultaram em importantes transformações a nível nacional e também na cidade de Lisboa.

Surge, por exemplo, uma classe operária emergente que começa a demarcar-se dos grupos mais pobres 

da população, querendo mostrar a sua identidade e diferença.

 

Os espaços e as situações de encontro multiplicam-se e o fado aparece como um veículo de sociabilidade.

 

O Fado é absorvido por esta nova classe emergente, não apenas como pretexto de encontro entre pessoas, mas também como uma forma de contar a sua vida, assumindo uma forma de crítica social e moral (por exemplo valorizando o contraste entre ricos e pobres, entre justos e injustos).

 

Quando a aristocracia boémia e as classes médias urbanas “redescobrem” este género, nas décadas 

de 1860 e 70, o Fado passa a ter lugar no teatro musical ligeiro, começa a ser publicado em edições de folhetos 

para uso doméstico e acabará por se tornar num favorito da indústria discográfica nascente.

 

O gosto pelo fado sai, assim de um grupo muito específico e marginal para se generalizar, começando 

a aparecer em pequenas publicações, festas de beneficência etc.

 

Desde o fim do século XIX até ao início do século XX assiste-se à proliferação de lugares e situações onde 

o fado se produz: entre eles, predominam tavernas, sociedades culturais e recreativas. Mas as suas grandes 

transformações aparecerão com o regime político instaurado pelo golpe militar de 1926, que termina com a

Primeira República e marca o início da ditadura.

 

O regime impõe a censura prévia, estabelecendo leis no que diz respeito às condições de exibição 

pública e os lugares onde o fado poderia acontecer. 

As letras cantadas pelos fadistas eram censuradas pela autoridade estabelecida.

 

Os fadistas eram obrigados a ter uma carteira profissional para cantarem em público. Para obtê-la, era 

necessário provar que não tinham antecedentes criminais.

 

 

 

O fado perde, assim, a sua espontaneidade, as suas características, o seu estilo de improvisação, passando 

de um gesto quotidiano para um espectáculo cheio de limitações e regras.

 

A rádio, mais que contribuir para a proliferação dessa música, induziu as formas mais subtis de 

censura, fazendo uma triagem das vozes e formas de cantar consideradas socialmente aceites pelo regime. A censura reina de forma absoluta.

Paralelamente, a repressão aumenta, assim como a acção da polícia em relação aos locais onde se cantava 

o fado, limitando-o às casas de fado ou a restaurantes especializados e demasiado homogeneizados.

 

 

 

 

 

O fado separa-se, assim, dos grupos marginalizados onde nasceu, para se constituir como uma forma de 

manifestação estável e institucionalizada muito bem aceite pela ditadura.

 

Uma das consequências da passagem do “fado-quotidiano” para o “fado-espectáculo” foi a forma como os                                                                fadistas começaram a vestir-se. No passado, a imagem não tinha nenhuma importância. A partir do 

momento que se transforma em espetáculo, os fadistas começam a vestir-se com pompa e o xaile 

colorido passa a ser um adereço fundamental de qualquer mulher que cantasse o fado.

 

É nesse contexto, em plena ditadura, que aparece Amália Rodrigues (1920-1999). Se a ditadura impôs

as transformações profundas nos locais e definiu quem podia cantar o fado, esvaziando-o de esponta-

neidade e improvisação, Amália Rodrigues foi sem dúvida o grande marco e quem mais 

revolucionou esta expressão musical portuguesa. Na minha opinião, partilhada por muitos, 

há um fado antes e outro após Amália.

 

Amália Rodrigues deu ao fado o preto como cor, os poemas e a voz. Ousou também cantar novas melodias 

que saíam completamente dos cânones tradicionais do fado. Saímos dos “fados-padrão” para a noção 

de “fado com música própria”. Estas melodias foram escritas, na sua maioria, pelo francês

nascido em Portugal Alain Oulman (1928-1990)  Amália é referência fundamental,  porque ousou mudar 

e mudou quase tudo. Criticada pelos puristas sobre a sua  forma de cantar – “à espanhola” ou “óperas”

em vez de fados –, de tudo se ouviu, mas nada a fez parar e Amália venceu.

 

A partir dos anos 1950, Amália Rodrigues começa a cantar os poemas dos grandes poetas da literatura 

portuguesa. De Luís de Camões aos poetas eruditos do seu tempo: David Mourão Ferreira, 

Pedro Homem de Mello, Alexandre O’Neill, entre outros. Também cantou Vinícius de Moraes. O

poema assume um estatuto que nunca teve antes na história do fado.

 

Amália, com a sua nova forma de cantar, fez um sucesso imenso e a ditadura faz do fado – e sobretudo 

de Amália Rodrigues – um cartão de visita do país no exterior. Razão pela qual após a queda da ditadura, em

25 de Abril de 1974, o fado e Amália Rodrigues foram tão criticados, já que para muitos portugueses eram 

a imagem do regime. Hoje essa questão circunstancial está completamente afastada: a imagem do fado foi 

recuperada, assim como a de Amália Rodrigues.

 

A partir da década de 1990, surge uma geração de fadistas com significativa projecção nacional e 

internacional. Porque a força do mercado é omnipresente e tudo precisa ser catalogado para ser vendido, 

essa geração passou a pertencer à categoria da World Music, sendo o fado uma presença quase 

obrigatória em eventos assim classificados. 

Em 2011, o Fado foi declarado Património Imaterial da Humanidade pela UNESCO.

 

O fado que escutamos hoje em dia perdeu bastante o seu carácter narrativo, de descrição dos aspectos do 

quotidiano ou contraditórios da sociedade.

Constatamos que a intenção de uma conclusão moral “final” também desapareceu. O que resta é um lamento, um murmúrio, a iminência de uma lágrima, uma dor representada, uma alegria, uma exultação, uma forma

de sentir partilhada por quem interpreta, acompanha ou assiste.

 

 

 

UMA NOITE DE FADOS

 

O fado, quando cantado, espera o silêncio e a cumplicidade de quem escuta. Quando há ruído na sala, 

ouve-se com frequência a chamada de atenção: “é tão fadista quem canta como quem ouve!”; 

ou “silêncio que se vai cantar o fado!”. Para quem o canta, é mais importante o silêncio conseguido 

na sala do que os aplausos após a prestação. 

Essa característica ritual faz da performance do fado um ato colectivo de tipo celebratório. 

É nesse sentido que podemos também falar de partilha emocional, mais que de arte espectacular.

 

Nas casas de fado não há amplificação de som. Canta-se “a seco”. O silêncio é fundamental para a emoção que o fadista exprime no momento, mas também para que seja possível escutar os instrumentos que acompanham a voz e possibilitar este diálogo entre a voz e as guitarras.

 

O Fado é tradicionalmente acompanhado por dois instrumentos, a viola e a guitarra portuguesa, 

assumindo esta um papel fundamental. 

A guitarra portuguesa, para quem não conhece, é uma muito provável evolução da guitarra inglesa,

entretanto desaparecida. Introduzida em Portugal a partir das colónias  de ingleses de Lisboa e do Porto, 

a guitarra inglesa conheceu uma grande divulgação nos salões europeus de meados do século XVIII. 

Em forma de pera, derivada da cítara, essa guitarra compunha-se de dez cordas, agrupadas em                              

quatro pares, mais duas cordas soltas. De utilização exclusiva nos círculos da burguesia e da nobreza 

dos salões urbanos, é associada ao acompanhamento de cançonetas italianas de carácter mais erudito.

 

A partir do início do século XIX surge nas fontes históricas a designação de “guitarra portuguesa”, 

que se refere ao modelo de seis pares de cordas, uma alteração provavelmente introduzida em Portugal. 

Sobretudo a partir de 1840 há notícias da sua associação ao contexto performativo fadista, em que 

assumirá um papel de absoluta centralidade.

Por vezes, o baixo acústico e, mais recentemente, o contrabaixo poderão estar presentes numa sessão de fados.

 

 A viola dá a base rítmica e harmónica, e a guitarra portuguesa improvisa frases sustentadas por ricas 

harmonias, dialogando assim com a voz.Raramente a guitarra portuguesa toca do mesmo modo o mesmo 

fado. É necessário não esquecer que só muito recentemente surgiram algumas partituras escritas e,   

mais importante, apenas na viragem do milénio a guitarra portuguesa teve o direito de entrar no 

Conservatório Nacional, em Lisboa, com o mesmo estatuto que os restantes instrumentos musicais aí 

ensinados. Até então, era um instrumento popular desvalorizado e associado apenas ao fado. 

 

Quem contribuiu de forma apaixonada e exímia para a valorização da guitarra portuguesa 

como instrumento autónomo foi Carlos Paredes (1925-2004), que correu o mundo com a sua guitarra 

portuguesa e as suas composições instrumentais originais.

 

O gosto pelo fado por parte das camadas mais jovens (mas também por parte dos fadistas 

e instrumentistas mais velhos) permite que este género musical continue a acontecer de forma 

livre e improvisada, um pouco como sucede com certas vertentes do tango, do blues, ou do flamenco.

 

Existe uma grande oferta de casas de fado em Lisboa, algumas necessariamente voltadas ao consumo 

dos turistas – onde não há grande lugar para a improvisação –, outras em que o fado acontece de 

forma livre e verdadeira – as casas do chamado “fado vadio”. Isso quer dizer que há músicos residentes 

(um guitarra e um viola). 

Normalmente há um(a) fadista contratado(a) pela casa e, depois, os clientes, vizinhos e amigos da casa

que gostam de cantar o fado inscrevem-se/pedem para cantar, sempre com certa triagem feita pelo

 dono da taberna, do restaurante ou da casa.

 

E como é possível que nesses ambientes o fado possa acontecer sem que, muito frequentemente, os fadistas 

e músicos se conheçam, sem ensaios, sem preparação prévia?

 

A razão é que o fado de Lisboa tem pelo menos 180 melodias/fados chamados tradicionais 

– o fado “Tango”, o “Margaridas”, o “Sem Pernas”, o “Maria Vitória”, o “Santa Luzia”, o “Alberto”, etc. 

Em princípio, um bom guitarrista deve conhecê-los todos e em todos os tons. Lembremos que uma boa parte

das melodias do fado tradicional são simples. É, sobretudo, a interpretação de quem canta e o diálogo com os 

músicos que lhe confere riqueza.

 

Dessa forma, quando é chamado, o fadista dirige-se aos músicos e pede, por exemplo, o fado “Alberto” 

em lá, ou o fado “Georgino” em mi. Tem que dizer se o ritmo é lento ou “picado” (rápido). 

O fadista põe o poema que entende e que gosta de cantar. Pode ser um poema erudito ou popular. 

Numa só noite de fados podemos ouvir a mesma melodia cantada várias vezes, com poemas 

e interpretações diferentes. 

É preciso ser um razoavelmente bom conhecedor do fado para detectar que se tratada mesma melodia, 

do mesmo fado.

 

 

Normalmente, cada fadista canta três ou quatro canções e fazem-se vários intervalos durante a noite para que 

as pessoas possam falar e os clientes sejam servidos, porque, enquanto se canta o fado, o silêncio absoluto deve 

reinar. Mais uma vez o dono da casa tem um papel fundamental de controle e exigência desse silêncio. 

Também o público mais atento e experiente não hesitará em mandar calar se houver alguém que 

perturbe a performance.

 

Os fados “com música própria”, que Amália Rodrigues e Alain Oulman introduziram – e que são muito 

frequentes nos fadistas das gerações mais jovens – são raramente tocados nesse tipo de ambiente. 

São fados cuja melodia é mais elaborada, mais difícil de transpor e pressupõem ensaio,

o que não é compatível com o ambiente onde o fado vadio acontece.

 

Esse modo de cantar o fado que assim se instalou, em que a improvisação tem um papel fundamental, 

faz com que, por vezes, haja noites de relativo insucesso, mas outras absolutamente gloriosas. Não foram

poucas as vezes que entrei numa casa de fados onde se começou a cantar às 10 horas da noite, só se 

terminando às 4 ou 5 horas da manhã. Os dedos dos guitarristas resistem dificilmente nessas 

circunstâncias, apesar do hábito de tocarem todos os dias.

 

 

PARA TERMINAR...

 

Não é impossível uma dança converter-se numa canção. E, muito provavelmente, isso terá acontecido 

com o fado. É, pois, no mínimo legítimo interrogar como uma dança terá ganho foros de canção 

num contexto urbano (Lisboa) atravessado de múltiplas formas musicais tradicionais.

Ou como a base musical de uma coreografia sincopada pode estar na origem da musicalidade do fado.

 

O fado terá, pois, um “princípio, meio e fim” em que se cruzam as músicas presentes nos bairros populares 

lisboetas dos séculos XVIII e XIX. É isso que poderemos designar por “musicalidade fadista”.

A fixação dessa musicalidade naquilo a que chamaríamos um “género”, é um longo processo em que cada

 “conto acrescenta um ponto”. Ou, se quisermos, em que “cada fadista acrescenta um fado”, ou 

“cada guitarrista acrescenta uma melodia ou uma harmonia”.

 

A musicalidade fadista de hoje talvez seja uma combinação de todos os factores que lhe foram adicionados e 

multiplicados desde há mais de dois séculos.O quadro musical a que hoje chegámos é o fruto dessa pluralidade criativa.

 

Poderemos tentar definir as regularidades, os padrões harmónicos, a estrutura rítmica, e certamente nos 

confrontaremos com algo reconhecível numa unicidade. Mas também é verdade que várias outras formas 

musicais poderiam convergir no fado por essas mesmas características. 

Talvez seja devido a isso que muitas canções são facilmente “afadistáveis”.

 

O contexto ritual fadista compõe a outra parte do fado – aquela em que mesmo quem não canta 

e quem não toca guitarra participa voluntariamente, adoptando o mesmo registo cultural dos artistas. 

“É tão fadista quem canta como quem ouve”, dissemos atrás.

 

O silêncio, que é um sinal tão forte da performance fadista, poderá ter sido uma das formas de o ritualizar.

 

De início declamado ou cantado em ambientes “naturalmente” muito barulhentos (como a taberna), 

não seria surpreendente que quem quisesse compreender a história contada pelo fado pedisse 

menos barulho (ou mesmo silêncio).

 

Não me surpreenderia, pois (mas é apenas um palpite sem qualquer fundamento científico), 

que essa fosse uma das características da “cristalização dinâmica” de vários elementos 

em torno daquilo a que se convencionou chamar fado nos seus primórdios.

 

O silêncio é, na minha opinião, peça-chave na musicalidade do género. Sem silêncio não acontece fado.

 

Silêncio que se vai cantar o fado...!

 

(Cristina Rosal)

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Muitos tem tentado apresentar a sua versão como a verdadeira e provada história do fado... outros mesmo chegam até afirmar, ser o fado a canção de Lisboa. 
O fado jamais alguém apresentará a sua história com certeza de como e onde nasceu, porque o fado é fruto de muitas razões e contextos no seu processo evolutivo.

A única forma de escrever sobre a história do fado, só poderá ser através da procura das suas origens, adentro das questões relacionadas entre si e que ajudam a contextualizar certas épocas e implicações no processo histórico de um povo que precisou vencer muitas dificuldades especificas na sua afirmação pela diversidade e influência do seu mosaico cultural e étnico, diversificado e com ramificações importantes ao Atlântico Sul.

Temos de saber por exemplo, de onde vem a nossa tristeza, tão presente na nossa própria idiocrasia na forma de ser como povo.

Tais como por exemplo, a vitória do norte cruzado e católico, com o sul mourisco. Como se sabe, grande parte do centro sul de Portugal, teve uma colonização e influência árabe muçulmana mais marcante nomeadamente pelo tempo de presença destes no centro sul.
Foi do Porto, que saíram os cruzados portugueses por terra e os cruzados, franco e bretões pelo mar, e como é sabido,... para libertaram Lisboa dos mouros. 
E cuja primeira vitima, foi precisamente o Bispo de Lisboa. Como se sabe apesar do domínio árabe-muçulmano, na cidade de Lisboa, conviviam sem problemas as três religiões monetaistas: cristãos, judeus e muçulmanos.

1 - Que influência teve nos denominados árabes muçulmanos, que ocupavam desde o século VII, grande parte de Portugal e da sua consequente submissão aos católicos vencedores?
2 - Quais foram as consequências de séculos da Inquisição em Portugal, desde finais do século XIV, sobre os muçulmanos e os judeus e obrigados à conversão?
3 - Que influencia, terá tido nos portugueses destacados para a colónia do Brasil, no seu contacto com os escravos negros levados à força da África para serem escravizados no Brasil - E que além de levarem os seus batuques ritmados naturais africanos, também tiveram de sofrer a desdita da distância, da ofensa à sua dignidade como povo e a separação forçada dos seus familiares em África. É natural o surgimento dos cânticos negros de tristeza pelas sua condições... e da sua relação com os portugueses idos para o Brasil, por razões de fé e do império... logo também sujeitos ao sofrimento pela distância e o tempo passado fora de Portugal e dos seus familiares... um desterro menos sofrido que os escravos negros, mas também sofrido.
4 - As consequências da fuga para o Brasil da coroa portuguesa em 1807, devido às invasões Napoliónicas e que duraram até 1815, tendo sido levados com a coroa para o Brasil, toda a aristocracia... os únicos que com o clero, sabiam ler e escrever.

Durante os anos das invasões napoleónicas, Portugal estava entregue apenas aos soldados e camponeses e sob tutela de uma regência inglesa.
A soberania portuguesa mudou-se para o Brasil, desde 1807 e foi lá que em 1815, se fundou o Império Luso-Brasileiro. 
5 - Jamais o Brasil, pela sua condição aristocrática e independente, voltou aceitar ser colónia a partir destes factos, a superioridade e vontade de Portugal em voltar a impor a sua decisão política centralizadora do poder sobre o Brasil, a partir de Lisboa. 
5 - O regresso de parte da corte a Portugal, e nomeadamente o rei D. João VI, tendo porém uma parte ficado no Brasil e com ela, quase toda a aristocracia que tinha ido em 1807.

Por isso não será de surpreender a relação do fado com o Brasil, e até, a influências da modinha brasileira dessa época na fado.

Procurei traçar os contextos, a seguir as manifestações que poderão explicar ainda o surgimento e outras questões na sua ligação e evolução do fado.

António Jorge

Na imagem; uma rua medieval no bairro de Alfama em Lisboa. 
Alfama é o mais antigo e um dos mais típicos bairros da cidade de Lisboa. 
O seu nome deriva do árabe al-hamma, que significa banhos ou fontes.
E, o bairro de Alfama, como a Mouraria e Madragoa, estão relacionados com os muçulmanos e às tais razões, relacionadas com a influência e ao nascimento do fado nas suas origens.

A Mouraria, é um dos mais tradicionais bairros da cidade de Lisboa, que deve o seu nome ao facto de D. Afonso Henriques, após a conquista de Lisboa, ter confinado uma zona da cidade para os muçulmanos. Foi neste bairro que permaneceram os mouros após a Reconquista Cristã. Por sua vez, os judeus foram confinados aos bairros do Castelo.

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O Fado e a sua história II

Tal como digo no primeiro capitulo deste texto, o fado nasceu inicialmente das vicissitudes históricas e dos relacionamento dos portugueses, das sua condições evolutivas ao longo de várias épocas e que se confundem com a fusão étnica do Portugal após a sua independência e que expandindo-se para sul, recuperou e integrou a parte mais sujeita à influência da cultura árabe muçulmana, com o peso das contradições e de que destaco numa primeira fase a sujeição mourisca aos cristãos e numa segunda fase, a partir do século XIV, os judeus… uns e outros obrigados à conversão religiosa pela força, ou a tortura e a cadeia e a morte e queimados em público pela inquisição… se não escapassem de Portugal.
É sabido, que aos originários de uns e de outros, os mouros e os judeus, em alternativa à morte, lhes foi dada a possibilidade de poderem ter um papel a desempenhar no colonização portuguesa além-mar, em nome da fé e do império.
Sabe-se que uma boa parte dos judeus portugueses, foram parar a África e principalmente ao Brasil, com grande expressão no Pernambuco… que está situado no Nordeste, precisamente, na zona próxima da Bahia, que foi a primeira capital do Brasil e onde mais se fez sentir o inicio da colonização do Brasil.

O fado nasceu assim de um caldo de culturas, interna e principalmente externamente e relacionado com o império, que aglutinou gentes de muitos lados e de muitas culturas, nomeadamente africanas no Brasil.

E no Brasil e porque não noutros lados… Porque não por exemplo no Vice-Reino do Oriente na Índia?
Por duas razões a saber: Quando os portugueses chegaram à Índia e impuseram, mesmo o domínio de uma parte desta a Oriente do continente asiático; Goa, Damão, Diu.
Portugal confrontou-se com uma parte mais desenvolvida à época no Mundo. 
A Índia, fazia parte da rota da seda, que ia da Índia à China, à Rússia e ao Médio Oriente, à Pérsia.
A colonização portuguesa na Índia, foi feita de forma muito diferente de quaisquer outros sítios, e nomeadamente entre portugueses com algumas das castas da Índia. 
Não foi por acaso, que a denominada Índia portuguesa, passou a Vice-Reino e cujos domínios iam até Moçambique e a outras possessões no Extremo Oriente.

No Brasil foi tudo muito diferente, desde logo porque naquela parte da América do Sul, se encontrarem os povos menos desenvolvidos que outros povos ameríndios. 
Dai também alguma explicação para a violência sanguinária espanhola contra os índios. Tiveram que subjugar e destruir grandes culturas e civilizações, tais como os Maias, Aztecas e os Incas.

A nós calhou a parte “doce” a chamada América Portuguesa, de tal forma, que até o padre António Vieira nos seus sermões, defendia o respeito pelos índios… Não tendo a mesma atitude em relação às condições e a escravatura dos negros.

Por isso mesmo, o Brasil foi fácil para a imposição da nossa cultura e consequentemente para as culturas africanas se desenvolverem misturadas e integrarem-se com a nossa. 
Mais ainda, depois da fuga da familia real para o Brasil, levando consigo toda a corte de Lisboa, bem como toda a aristocracia portuguesa… os que com o clero, eram os únicos que sabiam ler e escrever.
E foi assim, que passando o Brasil a ser a sede da coroa e da nossa independência, se foi transformando num espaço cada vez mais aristocrático no seu desenvolvimento em consequência da ida da Coroa para o Brasil, devido às invasões napoleónicas e que duraram, entre 1807 e 1822, ano em que o Brasil, ficou independente de Portugal.

No Brasil, foram recriados, amadurecidas e desenvolvidas pela influência de contactos permanentes e de proximidade e da integração e mistura da nossa cultura com as outras, nomeadamente vindas da África, como o Lundum do Congo ou mesmo da Nigéria… Não esquecer que independentemente da predominância dos escravos de Angola, do Benin ou da Nigéria, o Brasil recebeu todo o tipo de africanos, desde os berberes.

Acho que consegui pelo menos para já, estabelecer o contexto, as épocas e a atmosfera do ambiente cultural miscigenado, de onde o fado surgiu e brotou nos seus inícios.


Estou a fazer estes textos ao correr da pena… sem pretensões literárias, mas julgo estar a dar um contributo importante á história do fado, pela abrangência importante da sua génese e história e ajudar a vencer algum provincianismo e ficção na sua análise, por determinados autores, estarem fixados numa época apenas, que vem desde as cegadas... finais do século XIX, à figura de proa, a mística fadista, Maria Severa, e num local onde o fado, por razões obvias ganhou mais expressão, que foi na capital cosmopolita que é Lisboa, nomeadamente desde a descoberta do caminho marítimo para a índia, que a transformaram na capital das especiarias da Europa, após o bloqueio feito pelo império otomano, que acabaram com o domínio na Europa, de Florença na Itália, que era abastecida antes, pelos árabes.

Por exemplo a adaptação e desenvolvimento da guitarra portuguesa, está ligada à cidade do Porto, devido às suas relações privilegiadas com os ingleses. 
E por falar em guitarra portuguesa, se dúvidas ainda houvessem quanto às razões históricas sobre o fado tradicional vir originalmente do hemisfério sul, bastará questionar porquê, a afinação da guitarra de Coimbra ter um tom mais alto e as diferenças das letras cantadas pelos estudantes!

…continua

Arco do Marquês de Alegrete, em 1900
A Porta da Mouraria foi uma antiga porta da cidade de Lisboa, inserida na cerca fernandina da cidade.
Esta porta existiu na Mouraria até 1946 com o nome de Arco do Marquês de Alegrete.
Um pouco afastado dela se via embebida na parede da muralha, uma pedra histórica gravada, quem

vinha do Castelo de São Jorge.

Na imagem o antigo Arco do Alegrete na Mouraria - Lisboa

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