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A Guitarra Portuguesa

A sociedade ocidental contemporânea vive um processo acelerado de uniformização cultural

resultante da vontade política de globalização gradual dos mercados, da rapidez da comunicação

e de estratégias de massificação do conhecimento em geral, e é neste quadro que se torna

necessário e urgente a afirmação da singularidade cultural característica das pequenas regiões.

Propomos deste modo com a presente exposição, um olhar de descoberta sobre um instrumento

musical que assume por vezes a dimensão de símbolo identitário, decorrente da sua associação

com o universo mítico do fado e da sua presença multissecular na música em Portugal.

Descobrir a Guitarra Portuguesa é, portanto, conhecer as suas várias designações, a história do

seu passado e os nomes dos artesãos que, de geração em geração, ao longo de séculos a têm

fabricado.

O instrumento a que damos hoje o nome de Guitarra Portuguesa, foi conhecido até ao século XIX

em toda a Europa sob os nomes de Cítara (Portugal e Espanha), Cetra e Cetera (Itália e Córsega), Cistre (França), Cittern (Ilhas Britânicas), Zither e Cithren (Alemanha e Países Baixos). Tendo como origem directa a Cítara europeia do Renascimento, por sua vez filiada na Cítola Medieval, a Guitarra Portuguesa tal como a conhecemos hoje, sofreu importantes modificações técnicas no último século ( no aumento das dimensões da caixa de ressonância, no sistema mecânico de afinação, etc.), tendo no entanto conservado a afinação peculiar das cítaras, igual número de cordas e a técnica de dedilho própria deste género de instrumentos.

Desde o século XVIII, chegam-nos noticias diversas do uso da Guitarra, com alusão ao reportório partilhado com outros instrumentos como o Cravo ou a Viola e que incluem Sonatas, Minuetos, Marchas, Contradanças, Modinhas e Lunduns etc. Conhecemos deste período apenas dois instrumentos de Joaquim Pedro dos Reis (1764) e de João Correa d’ Almeida (1776), ambos de Lisboa. É nesta época (c.1760) que chega a Portugal a chamada Guitarra “Inglesa”, um tipo de Cítara europeia modificada por construtores ingleses, alemães e holandeses e acolhida com grande entusiasmo pela nova sociedade burguesa mercantil instalada na cidade do Porto, como se infere dos textos de António da Silva Leite (1759-1833), autor do único método para este instrumento publicado no nosso país em 1796 e também das Seis Sonatas para Guitarra, com acompanhamento de Violino e duas Trompas (1792).

Além deste autor, são de referir os nomes de António Pereira da Costa (XII Serenatas para Guitarra, Londres 1759), Manuel José Vidigal (Seis Minuetos dedicados a Lisboa) e numerosas obras manuscritas de João Gabriel Legras (Lições para Guitarra), Frei Francisco de São Boaventura (Sonatas para duas Guitarras e dois Violinos, 1789) Bartolomeu José                      V. P. Geraldes (Sonata para Guitarra e transcrição de 18 Sinfonias ou Aberturas de celebradas óperas de Rossini, Marcos Portugal, etc.) e António Justiniano Botelho (Variações para Guitarra Inglesa). Este tipo de Guitarra (baseado na imitação livre de alguns instrumentos estrangeiros introduzidos em Portugal), do qual conhecemos exemplares construídos por Jacó Vieira da Silva, de Lisboa (c.1790) e por Domingos José d’Araújo na cidade de Braga, (entre 1804 e 1820) tem uma difusão limitada às classes mais elevadas da sociedade, nunca se popularizando e acaba por desaparecer no fim do século XIX com a revitalização da Cítara popular, causada pela associação desta com o Fado de Lisboa, entretanto convertido em canção “nacional”. Segue-se um período de requalificação social do instrumento, passando este a ser designado por Guitarra Portuguesa e envolvendo na sua produção os nomes de construtores célebres como Manuel Pereira (Lisboa), 20 António Duarte (Porto), Augusto dos Santos (Coimbra), Manuel Pereira dos Santos (Alfena), Augusto Vieira e António Victor Vieira (Lisboa).

É na última década do século XIX que assistimos à importação de guitarras de Portugal para Inglaterra (caso da firma Alban Voigt & Co. de Londres, a qual edita também um método da autoria de Havelock Mason,em 1892) e para Alemanha (como no caso da firma BOEHM de Hamburgo, que utiliza o tipo português como modelo de base para a criação da Waldzither). No século XX, o número de fabricantes aumentou consideravelmente com os contributos valiosos de Álvaro Merceano da Silveira (Lisboa), Francisco Januário da Silva, (Lisboa) Domingos Cerqueira da Silva (Porto), João Pedro Grácio Junior (Cacém), Kim Grácio (Lisboa), Manuel Cardoso (Odivelas), Gilberto Grácio (Cacém) e, mais recentemente, Oscar Cardoso (Odivelas) e Fernando Meireles (Coimbra), para citar alguns dos mais considerados no meio dos guitarristas profissionais. É, pois, o testemunho do talento e do trabalho destes artesãos violeiros que nos propomos apresentar nesta mostra antológica sob o título “À Descoberta da Guitarra Portuguesa”, com o objectivo de fornecer mais um contributo crítico para futuros trabalhos de estudo sobre esta matéria.

 

© Pedro Caldeira Cabral

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